Para sanguessugas, quanto mais intricado, melhor

O quebra-cabeças

Blog Deu no Jornal

O caso dos Sanguessugas é um quebra-cabeças. As peças estão espalhadas. A maior parte sequer vai passar pela CPI. Vamos por partes. Se você é jornalista e está atrás da pauta do ano, leia com atenção este texto. Imprima, se quiser. Mande um e-mail depois de fazer a matéria que eu bato bumbo aqui no blog.

1) Neste final de semana, Luiz Antônio Vedoin, da Planam, fez mais revelações sobre nomes de deputados que negociaram com eles - inclusive envolvendo o senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), acusado noutras investigações de ter ligação com o quase onipresente bicheiro João Arcanjo. Uma das coisas que ficam claras na entrevista é o fato de que a Planam é apenas uma das empresas que atuam em dois ramos mais ou menos específicos (ambulâncias e ônibus de telecentros). Já se falou em empresas concorrentes. Alguém já checou que emendas essas empresas ganharam? Que deputados serviram a elas? Duvido que tenham sido apenas os dissidentes apontados pelo esquema da Planam.

2) Para ver a falta que faz checar os arquivos dos próprios jornais. Lembram da Operação Pororoca? Tratava de venda de emendas superfaturadas para construção de hospitais. Em 2004, Erick Janson Sobrinho Lucena, assessor do deputado paraense Benedito Dias, foi preso pela operação. Em 2006, o mesmo assessor foi preso pela Operação Sanguessuga. Janson tinha uma empresa de fachada junto com os Vedoin, que atuou nos dois esquemas. A operação prendeu também um então suplente de senador, que posteriormente virou senador. É senador hoje.

3) Por falar em operações antigas, lembra da Operação Gafanhoto? Entre no EXCELÊNCIAS e veja quantos deputados de Roraima envolvidos na Gafanhoto estão envolvidos na Sanguessuga. Idem com o Amapá e a Operação Pororoca. Será que tem ligação? Não sei. Mas, na esteira da cobertura do factual anunciado pelas instituições como a Polícia Federal e a CPI, presta-se tanta atenção nas árvores isoladamente que a floresta passa batido.

4) Fala-se agora em equipamentos de inclusão digital. Em 2003, o jornalista Maurício Tuffani descreveu na Folha de S.Paulo uma brecha orçamentária que permitia um alto grau de discricionariedade nos gastos da Ciência e Tecnologia voltados a essa área. Ninguém ficou de olho depois. Ninguém parece estar de olho hoje.

5) O esquema da Planam é muito provavelmente a proverbial ponta do iceberg. O ralo do Orçamento é um só: um determinado grau de discricionariedade, somado a um alto grau de obscurantismo. Veja no EXCELÊNCIAS o que são as emendas que os parlamentares apresentam ao Orçamento. Lendo-as, você entende claramente o que todas elas estão liberando dinheiro para comprar? Deveria. A informação teoricamente deveria ser fácil o suficiente - em termos de acesso e linguagem - para qualquer dona-de-casa saber se foi liberado dinheiro para a escola do filho ou do posto de saúde do bairro.

6) Não começou em janeiro de 2003. Não vai terminar em janeiro de 2007, seja quem for o presidente eleito ou o Congresso empossado. Dificilmente vai parar nos 68 deputados se olharmos além da ponta do iceberg. A questão é estrutural, institucional - não partidária. Enquanto estamos todos olhando ambulâncias e ônibus informatizados e fazendo as contas de quantos gols cada partido tomou, tem muito mais dinheiro público escoando para sanguessugas e outros parasitas (parasitas pode?).

É saudável que surjam os grandes escândalos, no sentido de que alertam a população para os ralos do dinheiro público. Mas o lado ruim deles é que nos levam a olhar para apenas um furo do ralo por vez. Quando o importante é compreender o mecanismo do ralo como um todo, para poder identificar os furos.

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