Por que Lula ganhou!

AS RAZÕES
Por que Lula ganhou

O Povo

Um candidato que transita entre os escândalos e o recorde de votos. Numa tentativa de fugir da incompreensão do fenômeno Lula e do misto de preconceito e adesão que marca boa parte dos analistas e observadores políticos

Érico Firmo
da Redação

Para explicar o porquê de ter votado em Lula, o pedreiro Raimundo Alves Tereza, de 57 anos, remete ao ano de 1973. Naquela época, ele só conseguiu comprar uma televisão após uma viagem ao Rio de Janeiro, onde os preços de aparelhos eletrônicos eram mais baixos. Esta semana, 23 anos depois, ele se prepara para comprar um outro aparelho de TV. O preço de R$ 600,00 será dividido em três parcelas - uma entrada de R$ 500,00 e duas prestações de R$ 50,00. Raimundo já tem uma TV em casa. "Mas eu quero é da grandona, da melhor que tem do mercado". E arremata: "Qual pobre que comprava televisão nova? Hoje televisão tá que nem tijolo", brinca.

As razões que fazem de Lula o vitorioso nesta eleição não são isoladas. Como em qualquer pleito, há um mosaico complexo e multifacetado de motivos para o resultado. Algumas explicações são subjetivas e fazem parte do imaginário popular. Outras, contudo, são bem palpáveis. Como a simples explicação que Raimundo dá para o que os especialistas chamam de microeconomia.
Morador do bairro Santa Cecília, em Fortaleza, Marcelo da Costa, 25 anos, lembra da dificuldade em arranjar emprego antes da eleição de Lula. "Quando era no tempo do Fernando Henrique, toda porta que eu batia era fechada. De lá para cá, nunca mais fiquei desempregado".


No Cariri, as amigas Maria de Lourdes da Silva e Severina do Espírito Santo disseram que votaram ontem em Lula porque o presidente ajuda os pobres. "A vida do pobre melhorou com o Bolsa-Família. E mesmo que não tivesse melhorado. Ele nunca buliu com eu (sic), nunca mexeu no meu salário", afirma Maria de Lourdes. Para Severina, além do programa social que beneficia sua neta, Lula teria recebido seu voto porque é quase-conterrâneo. "Aqui no horto quase toda família recebe Bolsa-Família. Mesmo se não fosse isso, eu sempre fui Lula porque ele é de Pernambuco", diz.

A conversa com os eleitores ajuda a desfazer alguns mitos, como a percepção de que o voto em Lula parte de pessoas que estão desinformadas sobre os escândalos e problemas nacionais. Conversando com eles, fica claro que as pessoas sabem o que está acontecendo. Mas têm uma idéia própria sobre os escândalos.

José Flávio, que é pintor no bairro Dias Macêdo, em Fortaleza, afirma que as denúncias só dificultaram a vida para a oposição. "O ataque ao Lula piorou foi mais ainda. Sem prova não é ataque", disse. Emanuela Monteiro Carneiro, moradora do Conjunto Ceará, afirma que soube das denúncias contra o atual governo, mas que isso não afetou sua intenção de votar. As denúncias são consideradas por ela parte já convencional da disputa política. "Quando chega tempo de eleição, eles botam tudo contra os outros", avalia.

Já Cícera Augustino dos Santos, que mora em uma casa de taipa no município de Forquilha, sem rede elétrica e sem esgoto, está decidida a votar em Lula, embora reconheça que não sabe quase nada do que se passou nestes quatro anos de governo, já que as baterias da televisão e do rádio quebradas há anos. "O (candidato) da gente é ele, né? A ajuda que a gente tem não é só essa mesmo", disse ela, que recebe R$ 50,00 do Bolsa-Família. "A gente passa (sobrevive) é com essa miséria aí mesmo. É o que tem", diz.

Contrariando a idéia de que o eleitor dos bairros mais afastados da área nobre da cidade seriam fáceis de ser convencidos, a dona-de-casa Emanuela Monteiro Carneiro, de 24 anos, moradora do Conjunto Ceará, diz que fica com um pé atrás em relação a Alckmin por causa das próprias propostas do candidato tucano - um discurso que ela acha "bonita demais". "Num acho que essa Alckmin vá fazer alguma coisa pela gente não. Tá com uma história muito bonita. A gente é de desconfiar". (Colaboraram Clovis Holanda e Márcio Teles)

Comentários

Daniela Moniwa disse…
O que será que a gente faz quando as pessoas se vêem tão sem esperança que 50 reais acabam definindo tudo o que elas acreditam?
Será que se nós teríamos a mesma postura se estivéssemos na pele da Severina, da Maria, da Lourdes....será?

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