FMI exige supervisionar economia dos EUA

Peter Dejong/Associated Press










CRISE NOS MERCADOS / FÓRUM DE DAVOS

Nº 1 do Fundo, Dominique Strauss-Kahn diz que "países desenvolvidos precisam aceitar ser escrutinados" pela instituição

EUA, donos da maior fatia de capital do FMI, sempre impuseram que o órgão vigiasse os países em desenvolvimento

Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, para quem os EUA estão sub-representados no Fundo Monetário Internacional

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS

Davos foi palco ontem de uma cena explícita de ironia: o novo diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional, o francês Dominique Strauss-Kahn, disse que "os países desenvolvidos precisam aceitar ser escrutinados pelo Fundo".

Na verdade, ele está se referindo aos EUA, até porque, pouco antes, havia dito que Washington recusara a hipótese de algum tipo de fiscalização.

A ironia está dada pelo fato de que os Estados Unidos, donos da maior fatia de capital do FMI, sempre impuseram ao Fundo que vigiasse os países em desenvolvimento, com o mesmo tipo de "escrutínio" agora defendido para o mundo rico.

A lógica por trás da afirmação de DSK, como é conhecido o novo diretor-gerente, é simples mas realista: "Nós estivemos focando, durante décadas, o que parecia ser o único problema, crises cambiais e de conta corrente nos países em desenvolvimento" (conta corrente é o resultado de todas as transações de um país com o mundo).

Agora, a crise tem seu epicentro em um país rico ou, mais exatamente, no mais rico de todos eles, os Estados Unidos.

Não foi, aliás, a única ironia do dia sobre o mesmo assunto. Pouco antes de Strauss-Kahn falar, em almoço no Waldhotel, no alto da montanha, lá em baixo, na Promenade, a única real avenida da pequena Davos, o chanceler brasileiro Celso Amorim dizia basicamente a mesma coisa, ao comentar a proposta do primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, para que o FMI criasse um mecanismo de "early warning" (aviso prévio) sobre crises.

"Concordo, desde que valha para todos", afirmou Amorim. E disparou sua ironia: "O FMI deve deixar de ser xerife do Terceiro Mundo para se transformar em órgão de supervisão geral". Mais: "Os Estados Unidos tiveram excessiva tolerância com os financiamentos "subprime'".
O almoço com Strauss-Kahn no Waldhotel foi uma espécie de ato de contrição, até porque a crise coloca "um desafio para a legitimidade do FMI e para a sua relevância", como disse Axel Weber, presidente do Bundesbank, o outrora todo-poderoso banco central alemão, agora apenas um braço nacional do BCE, o Banco Central Europeu.

Reforçou Mehmet Simsek, ministro turco de Economia: "As regras do jogo estão mudando. O mundo é muito mais complicado".

Weber também criticou o fato de que, "se hoje a questão do gerenciamento da crise é um tema importante, é apenas porque não se pôs ênfase na prevenção da crise".
Adiantaria tratar de preveni-la ou supervisionar os EUA? Strauss-Kahn tem dúvidas: "Não dá para dizer se a supervisão evitaria a presente crise".

Fórmula mágica
Já Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, o "irmão" do FMI, incumbido de financiar o desenvolvimento, advertiu contra a tentação de acreditar que uma redistribuição das cotas do capital do Fundo seria a fórmula mágica. Segundo as contas de Zoellick, "por qualquer critério métrico que se adotar, os Estados Unidos estão, na verdade, sub-representados" (ou seja, deveriam ter mais cotas do que têm).

DSK foi um pouco na mesma linha, ao se referir ao Brasil, que disse ser "muito vocal" na reivindicação do aumento de cotas para os países emergentes (o que é verdade). "Para quanto aumentaria a cota do Brasil? De 1,41% para 1,6% ou 1,7%? Não mudaria o mundo."
Mas não deixou de reconhecer que "a legitimidade da instituição está em jogo".

Fonte: Folha de S. Paulo

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