Governo rejeita operação da Vale para comprar a Xstrata





Governo é contra a aquisição da Xstrata

Claudia Safatle, Cristiano Romero e Vera Saavedra Durão

O governo não vê com bons olhos a compra da mineradora anglo-suíça Xstrata pela Companhia Vale do Rio Doce. A cúpula do governo, segundo apurou o Valor, considera o negócio "caro", "complicado" e prejudicial aos interesses do país. Por isso, o Palácio do Planalto deverá orientar os representantes do Conselho de Administração da Vale que têm vínculo com a União - BNDESPar e Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) - a rejeitar a operação, que depende de aprovação do conselho.

A oposição do governo ao negócio começa pelo preço - US$ 90 bilhões, quando a própria Vale é avaliada hoje em torno de US$ 120 bilhões. Na avaliação de um ministro, este não é um momento apropriado para aquisições, uma vez que os preços das mineradoras no mercado mundo estão muito elevados.

O governo tem resistência também a uma das formas de pagamento que a Vale pretende usar na operação: a troca de ações, com a oferta de US$ 30 bilhões em ações preferenciais (sem direito a voto). Isso transferiria para estrangeiros um bom pedaço do capital da companhia, que o Palácio do Planalto encara como "estratégica" para o desenvolvimento do país.

Na opinião de auxiliares do presidente, pelo menos um outro acionista da Vale com assento no Conselho de Administração deverá rejeitar a compra da Xstrata. "Vocês acham que o Bradesco concordará com esse negócio?", indagou um ministro. Segundo um outro ministro, o governo tem, além de "golden share" (12 ações com poder de veto em algumas decisões da Vale, como a mudança de sede para outro país ou a venda do controle para estrangeiros), um acordo de acionistas que assegura aos entes públicos (BNDESPar e Previ) a possibilidade de reprovar a operação.

A posição da cúpula do governo de rejeitar a potencial compra da Xstrata pela Vale surpreendeu tanto fontes próximas dos fundos de pensão envolvidos na negociação, como a diretoria executiva da empresa. Por meio de sua assessoria de imprensa, a direção da Vale considerou "prematuro" emitir opinião neste momento "porque ninguém tem informações do negócio, nem mesmo o conselho de administração da companhia". Mas, afirmou respeitar "a opinião de todos, mesmo sem informação". E conclui: "Vamos fazer o que for melhor para o acionista da Vale."


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A oposição do governo começa pelo valor do negócio, estimado em US$ 90 bi, a Vale é avaliada em US$ 120 bi
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Os temores dos assessores do Planalto em relação a situação atual do mercado e a possibilidade de uma diluição do controle da companhia face a uma emissão de ações preferenciais para pagar a Xstrata são compartilhados pela Previ e por outros fundos que detêm ações da Vale, conforme apurou o Valor, mas os acionistas controladores estão ainda no início de uma análise técnica e estratégia sobre a aquisição da mineradora anglo-suiça, estimada preliminarmente em US$ 90 bilhões. "A operação faz sentido, mas o mercado assusta", confessa um interlocutor.

A atitude do governo de conversar com o presidente da Previ, Sérgio Rosa e com o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, a respeito do andamento de negócios em empresas privadas onde integram o bloco de controle, é corriqueira, segundo ex-conselheiros da Vale. Rosa, que preside o conselho de administração da Vale, tem conversado com o governo e com outros acionistas que participam indiretamente do bloco de controle da Valepar, como Petros, Funcef e Funcesp. Ele não tem escondido sua preocupação com a operação Xstrata nos encontros com representantes destes fundos, como admitiram fontes. Mas, no seu discurso até agora não há posição fechada sobre a operação de compra da Xstrata. O dirigente da Previ, procurado para falar sobre a operação, não foi encontrado.

Se o governo quiser mesmo "orientar" Previ e BNDES a reprovar a compra da Xstrata , como declararam os ministros ao Valor, eles têm total chance de barrar a operação porque os dois representam 60,5% do capital votante. Já que para as grandes decisões , conforme cláusula V, do acordo de acionistas, referente a reuniões prévias do conselho, é exigido o voto favorável de 67% das ações ordinárias em poder dos acionistas. Os demais acionistas, Bradesco e Mitsui, não têm peso para aprovar a operação: juntos somam 40%. Além disto, a Previ (com 49,5%) é o único acionista do bloco com direito de veto nas decisões do conselho, já que sua fatia de ordinárias na Valepar supera 25%. O acordo de acionistas foi assinado em 1997 e tem vigência por 20 anos.

A ação "golden share" da Vale é perpétua, mas não tem direito de veto nestas operações. Entretanto, através desta ação, o governo pode se pronunciar sobre qualquer modificação dos direitos atribuídos às espécies e classes das ações de emissão da Vale, ou qualquer modificação de quaisquer dos direitos atribuídos pelo Estatuto Social à ação preferencial de classe especial (PNA). Um advogado de direito societário disse ao Valor, que, em princípio, uma emissão de preferenciais de classe especial, como é o caso da PNA da Vale, não embute o risco de ampliar a internacionalização societária da companhia. "A quantidade de ordinárias não foi mexida. Mas, mesmo assim, defendo que os acionistas controladores olhem com muito esta operação, pois depois de feita não tem jeito de voltar atrás".

A questão é polêmica, apesar do capital em ações ser usado pelos grandes grupos internacionais nestas operações. Para um acionista controlador ouvido pelo Valor, é preciso debater muito a questão envolvendo a estrutura de controle acionário da Vale antes de aprovar qualquer aquisição, mesmo que seja positiva para a empresa. "A empresa não é dos executivos, eles têm que prestar contas aos controladores", disparou a fonte.

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