Guerrilha do Araguaia: assassinato e ocultação de cadáver




Ex-soldado quer colaborar

Vasconcelo Quadros (Brasília)

O relato inédito do ex-soldado Lourivan Rodrigues de Carvalho ao JB apontando as circunstâncias da morte e o local onde foi enterrado, entre o final de agosto e início de setembro de 1974, o advogado Demerval da Silva Pereira, o João Araguaia, é uma evidência de que sobram informações e falta vontade política ao governo para dar uma satisfação ao drama das famílias dos 58 ativistas do PC do B desaparecidos durante a Guerrilha do Araguaia. Lourivan disse que nunca foi procurado por qualquer representante do governo, embora há 35 anos trabalhe a 300 metros da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), à qual está vinculada a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, encarregada das buscas sobre desaparecidos.

- Não vejo problemas em esclarecer - disse ele, ao admitir que, se procurado, prestará depoimento explicando as circunstâncias em que Demerval foi fuzilado.

Lourivan trabalha como auxiliar de portaria no prédio do Ministério da Saúde, separado dos blocos do Ministério da Justiça e da SEDH apenas pelo extenso gramado da Esplanada dos Ministérios. Afirma que desde que mudou de Marabá para Brasília, em 1975, traumatizado com a experiência de repressão à guerrilha, havia deixado de se interessar pelo tema. O ex-soldado admitiu ser o militar em quem João Araguaia, num gesto desesperado, jogou uma caneca com água.

Centro de tortura

Segundo seu relato, outro militar, que ele conheceu por soldado Bastos, disparou uma rajada de Fuzil Automático Leve (FAL), matando na hora o guerrilheiro que, logo em seguida, foi enterrado a 60 metros do local, no pé de um ingazeiro, às margens do Rio Itacaiúnas, no mesmo terreno onde hoje está instalado o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transporte (Denit). Antiga sede do DNER o local abrigava um centro de tortura conhecido como Casa Azul, onde teriam sido executados vários outros guerrilheiros.

Representante dos parentes na Comissão de Mortos e Desaparecidos da SEDH, a ativista Diva Santana - irmã de uma guerrilheira morta na região, Dinaelza Santana Coqueiro, desaparecida junto com o marido, Vandick Reidner Coqueiro - disse que o relato do soldado, se confirmado, esclareceria um dos mais intrincados casos ainda pendentes. Ela disse que as revelações poderão ajudar nas buscas que a comissão fará a partir de março no Araguaia, assim que terminar o período das chuvas na região.

- O que a gente sabia era que o Demerval havia sido preso e que muitos moradores o viram ferido. Mas não se sabia como foi morto ou onde foi enterrado - disse Diva.
Na entrevista ao JB, o ex-soldado afirmou que, apesar do tempo, conseguiria identificar o local exato onde ele e outros recrutas enterraram o corpo do guerrilheiro.

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