Latifundio cartorial na mira da "Reforma Agrária"

Por essa os nobres cartorários brasileiros não esperavam. Misto de Capitania Hereditária e Tabelas segundo a cara do freguês, esse é um dos setores em que reformas profundas nunca passaram de rímel e batom. Entretanto, esse latifundio parece que estar com os dias contados, segundo excelente reportagem do colega Lúcio Vaz para o Correio Braziliense de hoje.

Vejam como faz bem à Nação a criação do Conselho Nacional de Justiça.

''Reforma agrária'' nos cartórios

Lúcio Vaz - Da equipe do Correio


Pesquisa realizada pelo CNJ revela concentração de faturamento no eixo Rio-São Paulo

Levantamento inédito feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre os cartórios no Brasil revela uma realidade desigual. Os números mostram que cerca da metade deles tem renda mensal até R$ 5 mil, enquanto outros 1.330 têm rendimentos acima de R$ 50 mil por mês. Os 100 maiores cartórios têm faturamento mensal entre R$ 500 mil e R$ 2 milhões. Juntas, as 10,7 mil serventias extrajudiciais que já prestaram informações arrecadaram R$ 3,8 bilhões em 2006. Esse valor é próximo da soma dos orçamentos dos tribunais superiores. O estudo deverá resultar numa redivisão dos cartórios que arrecadam mais, numa espécie de “reforma agrária” do setor.

Os maiores “latifúndios” ficam no Rio de Janeiro e em São Paulo. São geralmente cartórios de registro de imóveis. O maior deles, com cerca de 150 funcionários, localizado no Rio, faturou R$ 28,3 milhões em 2006, o equivalente a uma mega-sena acumulada. A renda mensal foi de R$ 2,36 milhões. A segunda maior arrecadação ficou com um cartório de São Paulo: R$ 26,9 milhões naquele ano. O estado conta com sete dos 10 maiores cartórios do país, com renda anual a partir de R$ 13,1 milhões. Juntos eles faturaram R$ 140 milhões em 2006. Fora do eixo Rio-São Paulo, aparece uma serventia do Paraná com rendimento de R$ 17,9 milhões (sétimo lugar), e outra de Goiás com R$ 12,8 milhões (11º lugar).

Na outra ponta da pirâmide estão 1.446 cartórios que faturam até R$ 6 mil por ano. São míseros R$ 500 por mês. Outras 792 serventias têm renda anual entre R$ 6 mil e R$ 12 mil. Esses cartórios estão localizados principalmente nos municípios mais remotos, nas regiões Norte e Nordeste. O número deles pode ser ainda maior, porque o levantamento feito pelo CNJ ainda não está concluído. Das 13.405 serventias cadastradas, 10.712 já haviam prestado todas as informações solicitadas até a última sexta-feira. As 2.693 que ainda não forneceram seus dados estão localizadas justamente nos grotões do país.

Realidade desconhecida
Os números apurados pela pesquisa surpreenderam o corregedor-geral do CNJ, ministro Cesar Asfor Rocha, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça. “O levantamento mostra uma realidade que ninguém conhecia”, comentou. Ele ficou impressionado com a polpuda arrecadação de um número significativo de cartórios. “Dá para sustentar todas as cortes superiores”, comparou. Segundo o corregedor, esses dados explicam por que juízes, desembargadores aposentados, têm assumido algumas serventias. Ele esclarece, porém, que o levantamento registra o faturamento, não o lucro do cartório. Para se chegar a isso, é preciso considerar despesas com funcionários, instalações, informática, luz, água e impostos.

Com uma linguagem cuidadosa, Asfor avisa: “A corregedoria vai propor ao CNJ uma realinhamento no setor”. Isso significa a partilha dos cartórios mais rentáveis. Ele também antecipa outras providências que resultarão do conhecimento das informações obtidas. “A partir desses dados, vamos estudar a formação de um fundo para o reaparelhamento do Poder Judiciário. Esses fundos existem em alguns estados, mas de forma desigual. Cada estado faz o seu. Agora, o CNJ vai traçar diretrizes para a organização desse fundo”, explicou.

Outra preocupação do ministro é com a manutenção das serventias menos rentáveis. “Há, ainda, a possibilidade de haver um fundo para a sustentabilidade de serventias que não podem se manter. Elas são importantes porque fazem o registro civil de pessoa natural (RCPN). Hoje, cerca de 500 mil pessoas não são registradas no país. Uma das metas do CNJ é erradicar o subregistro”, acrescentou. Com a formação desse fundo, parte da arrecadação total de cada estado será destinada para a manutenção dos cartórios menores. Isso já existe em São Paulo, onde 5% da receita bruta do setor é utilizada para assegurar uma renda mensal de pelo menos 10 salários mínimos para as pequenas serventias, como prevê a Lei nº 11.331/2002.

A coleta de dados começou em junho do ano passado, com uma equipe de apenas quatro pessoas, quando Asfor assumiu a Corregedoria do CNJ. “Eu perguntei: ‘Quantos cartórios tem no Brasil?’ Ninguém sabia. Mandei fazer o levantamento”. Hoje, a corregedoria sabe até mesmo o número total de funcionários das serventias: 50.452, sendo 6.841 em cartórios privados. Até 1988, o governo nomeava os tabeliães dos cartórios, que depois eram passados de pai para filho. Com a nova Constituição, foi criada a exigência de concurso público para tabeliães. Mas 3.871 cartórios continuam públicos. Asfor vê um ponto positivo na mudança: “Com a privatização de 88, o serviço foi profissionalizado”. A informatização dos serviços avançou muito nos últimos anos.

O levantamento mostra uma realidade que ninguém conhecia

Cesar Asfor Rocha, corregedor-geral do CNJ
Lúcio Vaz - Da equipe do Correio

Pesquisa realizada pelo CNJ revela concentração de faturamento no eixo Rio-São Paulo

Levantamento inédito feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre os cartórios no Brasil revela uma realidade desigual. Os números mostram que cerca da metade deles tem renda mensal até R$ 5 mil, enquanto outros 1.330 têm rendimentos acima de R$ 50 mil por mês. Os 100 maiores cartórios têm faturamento mensal entre R$ 500 mil e R$ 2 milhões. Juntas, as 10,7 mil serventias extrajudiciais que já prestaram informações arrecadaram R$ 3,8 bilhões em 2006. Esse valor é próximo da soma dos orçamentos dos tribunais superiores. O estudo deverá resultar numa redivisão dos cartórios que arrecadam mais, numa espécie de “reforma agrária” do setor.

Os maiores “latifúndios” ficam no Rio de Janeiro e em São Paulo. São geralmente cartórios de registro de imóveis. O maior deles, com cerca de 150 funcionários, localizado no Rio, faturou R$ 28,3 milhões em 2006, o equivalente a uma mega-sena acumulada. A renda mensal foi de R$ 2,36 milhões. A segunda maior arrecadação ficou com um cartório de São Paulo: R$ 26,9 milhões naquele ano. O estado conta com sete dos 10 maiores cartórios do país, com renda anual a partir de R$ 13,1 milhões. Juntos eles faturaram R$ 140 milhões em 2006. Fora do eixo Rio-São Paulo, aparece uma serventia do Paraná com rendimento de R$ 17,9 milhões (sétimo lugar), e outra de Goiás com R$ 12,8 milhões (11º lugar).

Na outra ponta da pirâmide estão 1.446 cartórios que faturam até R$ 6 mil por ano. São míseros R$ 500 por mês. Outras 792 serventias têm renda anual entre R$ 6 mil e R$ 12 mil. Esses cartórios estão localizados principalmente nos municípios mais remotos, nas regiões Norte e Nordeste. O número deles pode ser ainda maior, porque o levantamento feito pelo CNJ ainda não está concluído. Das 13.405 serventias cadastradas, 10.712 já haviam prestado todas as informações solicitadas até a última sexta-feira. As 2.693 que ainda não forneceram seus dados estão localizadas justamente nos grotões do país.

Realidade desconhecida
Os números apurados pela pesquisa surpreenderam o corregedor-geral do CNJ, ministro Cesar Asfor Rocha, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça. “O levantamento mostra uma realidade que ninguém conhecia”, comentou. Ele ficou impressionado com a polpuda arrecadação de um número significativo de cartórios. “Dá para sustentar todas as cortes superiores”, comparou. Segundo o corregedor, esses dados explicam por que juízes, desembargadores aposentados, têm assumido algumas serventias. Ele esclarece, porém, que o levantamento registra o faturamento, não o lucro do cartório. Para se chegar a isso, é preciso considerar despesas com funcionários, instalações, informática, luz, água e impostos.

Com uma linguagem cuidadosa, Asfor avisa: “A corregedoria vai propor ao CNJ uma realinhamento no setor”. Isso significa a partilha dos cartórios mais rentáveis. Ele também antecipa outras providências que resultarão do conhecimento das informações obtidas. “A partir desses dados, vamos estudar a formação de um fundo para o reaparelhamento do Poder Judiciário. Esses fundos existem em alguns estados, mas de forma desigual. Cada estado faz o seu. Agora, o CNJ vai traçar diretrizes para a organização desse fundo”, explicou.

Outra preocupação do ministro é com a manutenção das serventias menos rentáveis. “Há, ainda, a possibilidade de haver um fundo para a sustentabilidade de serventias que não podem se manter. Elas são importantes porque fazem o registro civil de pessoa natural (RCPN). Hoje, cerca de 500 mil pessoas não são registradas no país. Uma das metas do CNJ é erradicar o subregistro”, acrescentou. Com a formação desse fundo, parte da arrecadação total de cada estado será destinada para a manutenção dos cartórios menores. Isso já existe em São Paulo, onde 5% da receita bruta do setor é utilizada para assegurar uma renda mensal de pelo menos 10 salários mínimos para as pequenas serventias, como prevê a Lei nº 11.331/2002.

A coleta de dados começou em junho do ano passado, com uma equipe de apenas quatro pessoas, quando Asfor assumiu a Corregedoria do CNJ. “Eu perguntei: ‘Quantos cartórios tem no Brasil?’ Ninguém sabia. Mandei fazer o levantamento”. Hoje, a corregedoria sabe até mesmo o número total de funcionários das serventias: 50.452, sendo 6.841 em cartórios privados. Até 1988, o governo nomeava os tabeliães dos cartórios, que depois eram passados de pai para filho. Com a nova Constituição, foi criada a exigência de concurso público para tabeliães. Mas 3.871 cartórios continuam públicos. Asfor vê um ponto positivo na mudança: “Com a privatização de 88, o serviço foi profissionalizado”. A informatização dos serviços avançou muito nos últimos anos.

O levantamento mostra uma realidade que ninguém conhecia

Cesar Asfor Rocha, corregedor-geral do CNJ

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