Decisão do TCU que autoriza renovação de Ferrovia Carajás repercute nos meios empresariais e políticos do Pará

Com a decisão do tribunal, Pará é prejudicado e perde o “trem da história” de melhoria na sua infraestrutura
A Estrada de Ferro Carajás (EF-315), também conhecida pela sigla EFC, com 892 km de extensão, em bitola larga, operada pela mineradora Vale S/, foi renovada por mais 37 anos

Brasília – Publicada com exclusividade pelo Blog do Zé Dudu, a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) na quarta-feira (29), que autorizou a renovação antecipada dos contratos de concessão da Estrada de Ferro Carajás (EFC), no Pará, e da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM, ambas exploradas pela mineradora Vale, teve grande repercussão nos meios empresariais e políticos. A Bancada do Pará foi atropelada pela do Mato Grosso, que ganhou a disputa política e comemorou a decisão que foi contemplada com a construção da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (FICO).

Ao todo, R$ 2,73 bilhões serão destinados à construção da FICO, no trecho entre Mara Rosa (GO) e Água Boa (MT). A nova ferrovia irá escoar a produção de grãos (soja e milho) do Vale do Araguaia, uma das maiores produtoras de soja do Brasil, até a Ferrovia Norte-Sul, criando acesso aos principais portos do país. Enquanto isso o Pará ficará a ver o “apito do trem da Vale”, que explora nas minas do Pará, a maior produção de minérios do planeta.

O desfecho que ajoelha o Pará mais uma vez diante de decisões tomadas em Brasília que desmoralizam seus interesses, foram alertadas em inúmeras reuniões anteriormente. Inicialmente nos corredores do ministério, em audiências públicas no Congresso Nacional e nas áreas interessadas. Audiências essas “esvaziadas”, uma vez que foram realizadas tão somente para cumprir o protocolo exigido pelos trâmites legais, uma vez que a decisão já estava sacramentada ainda no governo do ex-Presidente Michel Temer (MDB).

O governador Helder Barbalho (MDB) lamentou a decisão do TCU e disse que o Estado havia ingressado na Justiça contra a decisão e que aguarda a publicação do acórdão do tribunal para ver como vai agir. Confira o VT.

Reações

A repercussão sobre a decisão do TCU que referendou a decisão do governo federal teve início na manhã desta quinta-feira (30), em Belém, Brasília, Cuiabá e Goiânia. Os dois últimos comemorando, enquanto que a capital paraense e a Bancada do Pará, aos poucos começa a digerir os impactos que isso implicará para o desenvolvimento do Pará.

O ex-Secretário de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia do Estado Pará, Adnan Demachki, explicou alguns fatos que esclarecem os bastidores da questão. “Ainda no Governo, tive dois embates com o Tarcísio (Tarcísio Gomes de Freitas, ministro da Infraestrutura e que m 2015, atuou como secretário da Coordenação de Projetos da Secretaria Especial do Programa de Parceria de Investimentos [PPI], responsável pelo programa de privatizações, concessões e desestatizações), quando ele ainda trabalhava na PPI. Já naquele momento, essa era a estratégia do governo. Ao ser nomeado Ministro tocou pra frente o seu projeto. Alertei a classe política paraense. Mas a bancada nunca se juntou para pressionar o governo Federal de que parte desses recursos da renovação da ferrovia de Carajás deveria ficar no Pará. Enquanto isso a bancada de Mato Grosso permanentemente pressionava o Governo Federal”, revelou.

“Postei em minhas redes sociais constantes publicações sobre esse absurdo que iriam fazer com o Pará. A Vale ganharia três vezes, renovaria a concessão de ferrovia sem ter que lutar contra chineses e russos em licitação; o preço da renovação era praticamente vil, reconhecido em seguida pelo Ministério da Economia e pelo próprio TCU; e a Vale ganharia também centenas de milhões de dólares anuais, com o transporte dessa carga da FICO que teria que utilizar a ferrovia de Carajás até ser exportada pelo Porto de Itaqui”, disse Demachki.

“Já o Pará foi tripudiado também triplamente. Os impactos sócio ambientais que as nove minas da Vale causam ao Pará não foram compensados com parte desse dinheiro da renovação; esses recursos poderiam ter gerado a ferrovia paraense, ligando Santana do Araguaia a Barcarena, e por fim, com a construção da FICO e exportação por Itaqui, a borda leste do Pará ficou limitada em logística e em consequência no seu desenvolvimento econômico”, analisou o ex-secretário.

Para Adnan Demachki “é uma pena que a classe política e as entidades patronais maiores não se uniram em torno dessa causa importante para o Pará e literalmente ‘deixaram o trem passar’”, criticou. “Outra oportunidade como essa, só daqui há 30 anos com a próxima renovação da concessão”, lamentou.

Ex-Secretário de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia do Estado Pará, Adnan Demachki

Desunião

O vice-líder do Bloco: PL, PP, PSD, PSDB, REPUBLICANOS, SOLIDARIEDADE, PTB, PROS, PSC, AVANTE e PATRIOTA na Câmara dos Deputados, deputado federal Joaquim Passarinho (PSD-PA), declarou ao Blog do Zé Dudu: “Afinal o TCU autorizou a renovação da concessão da Estrada de Ferro de Carajás, operada pela Vale. Algo que deveríamos comemorar. Deveríamos, se não fosse o destino desses recursos, anunciados para duas Estradas de Ferro fora do Pará. Linhas importantes para o Brasil, estratégicas sim, para o escoamento da produção, porém o Pará perde a maior oportunidade de alavancar nosso crescimento, quando nossa Estrada de Ferro Paraense fica em segundo plano. Triste a falta de interesse do Governo do Estado na implantação da ‘Ferrovia de Integração’ do Pará”.

O parlamentar acusou que: O Projeto foi abandonado, desprezado o que levou o Governo Federal decidir por propostas mais avançadas. É mais uma oportunidade perdida. Esse assunto deveria ser um fator de união de toda a ‘classe política’ paraense, mas disputas ‘paroquiais’ estão deixando o ‘trem’ passar.”

Passarinho acrescentou que: “Vamos pagar o preço por isso. Precisamos que o Governo do Pará se posicione e tome a frente dessa bandeira. Não interessa de quem é a ideia ou o Projeto, quem idealizou ou pensou, nosso desenvolvimento não tem cor partidária”, cobrou, afirmando que: “Eu ainda não desisti. Vou estudar uma forma de ver o nosso estado compensado de alguma maneira”, prometeu.

“Vou lutar, mesmo com poucos, até o fim. Precisamos que o Governo Federal tenha esse olhar estratégico para nossa região. O Pará é solução para o Brasil”, lembrou.

Deputado Joaquim Passarinho: “Vou lutar, mesmo com poucos, até o fim. Precisamos que o Governo Federal tenha esse olhar estratégico para nossa região. O Pará é solução para o Brasil”

Prejuízos

Por telefone, o deputado federal Cássio Andrade (PSB-PA), vice-presidente da Comissão de Minas e Energia ficou indignado com a decisão do governo federal. “Um absurdo mais esse prejuízo ao Pará, principalmente pelos argumentos inaceitáveis que tentam justificar a decisão”, protestou.

Nessa renovação de contratos, há investimentos de R$ 21 bilhões, permitindo usar parte do valor de outorga para a construção de novas ferrovias com investimento privado. Ocorre que a decisão não destinou nenhuma contrapartida ao Pará, enquanto o Mato Grosso será contemplado com uma nova ferrovia.

Cássio lembrou do projeto da Ferrovia Paraense (Fepasa), que partiria de Santana do Araguaia, passaria por Marabá e seguiria até Barcarena, de onde a produção mineral do Estado e outros produtos poderia ser exportada via marítima, gerando ainda mais desenvolvimento e divisas para o Pará. “O Pará perdeu recursos importantíssimos que seriam gerados com esse investimento que tínhamos direito, sendo que agora outros estados serão beneficiados. Mais uma vez fica comprovado que o Pará sofre discriminação e arca com todos os prejuízos da exploração mineral em nosso território, sem justa compensação”, apontou.

O parlamentar paraense lembra fez um discurso na tribuna da Câmara sobre essa questão e que chegou a requerer, no final de 2019, a realização de uma audiência pública na Comissão de Minas e Energia para debater esse assunto, com o objetivo de defender os interesses do Pará. Logo depois o Congresso Nacional entrou em recesso e em seguida veio a pandemia e a audiência não se realizou. Com a queda de produção da Vale em Minas Gerais, a empresa precisaria elevar a produção da mina de Canaã dos Carajás  (com custo de produção baixo e única mina da Vale sem barragens) para compensar a queda da produção em MG e nesse sentido a Vale precisaria de um novo Porto além de Itaqui (MA), e esse novo porto é Barcarena, mas para que a Vale chegue com seu minério em Barcarena, também dependeria da Fepasa (de uma ferrovia ligando o sul do Pará ao Porto de Barcarena), pontuou o parlamentar.

Deputado Cássio Andrade: “Um absurdo mais esse prejuízo ao Pará, principalmente pelos argumentos inaceitáveis que tentam justificar a decisão”

Impactos são sentidos pelo povo do Pará

O senador Zequinha Marinho recorda: “Lembro que essa tentativa de saquear o Estado do Pará e os paraenses foi iniciada no governo Temer, quando o atual ministro dos Transportes, Tarcísio Freitas, estava à frente do Programa de Parcerias para Investimentos (PPI). Desde que passei a representar o Pará no Senado Federal, vinha acompanhando o processo de antecipação da renovação da outorga da Estrada de Ferro Carajás”, disse.

“Em maio deste ano, a área técnica do TCU chegou a apresentar parecer desfavorável a renovação antecipada, solicitando o arquivamento da proposta. Da noite para o dia, o TCU muda sua análise autorizando a renovação. No mínimo, é de se estranhar essa mudança tão abrupta de postura do tribunal”, analisa o senador Zequinha Marinho (PSC-PA), que na condição de coordenador da bancada paraense destaca a necessidade de somar forças de todos os parlamentares do estado para impedir que o recurso da renovação da Estrada de Ferro de Carajás saia do Pará para atender obra logística em outra região do país. “Essa ferrovia escoa os minérios localizados em solo paraense. Seus impactos são sentidos pelo povo do Pará. Não me oponho a construção da FICO. Acredito que o Brasil precisa investir mais em logística, contudo, é inaceitável que os recursos da ferrovia não sejam utilizados para o desenvolvimento do nosso Estado. A Ferrovia Pará, por exemplo, é um empreendimento que vai trazer desenvolvimento ao Estado, interligando a região norte ao extremo sul paraense. É a saída mais óbvia e adequada para receber os recursos da antecipação da outorga da Ferrovia Carajás”, defendeu o senador.

Senador Zequinha Marinho: “Essa ferrovia escoa os minérios localizados em solo paraense. Seus impactos são sentidos pelo povo do Pará

Comemoração

O líder do Governo na Câmara dos Deputados, deputado Major Vítor Hugo (PSL-GO) e o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, comemoraram a decisão do TCU ontem à noite durante as mais de 16 horas de votação de Medidas Provisórias na Casa, entre elas a MP 945/2020 enviada pelo governo que trata de medidas temporárias em resposta à pandemia decorrente da covid-19 no setor portuário e cessão de pátios sob administração militar. A sessão entrou pela madrugada, e o parlamentar gravou um VT nas suas redes sociais aplaudindo a decisão do TCU que beneficiou o seu estado Goiás. Confira a declaração.

Em nome do Sistema FIEMT, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso, Gustavo de Oliveira também aplaudiu a decisão. Veja o que ele disse.

Procurados para se posicionarem, vários parlamentares disseram através de suas assessorias que enviarão notas com declarações sobre o assunto à Sucursal de Brasília da Agência Carajás que edita o Blog do Zé DuduA reportagem aguarda também o posicionamento de várias entidades que foram contatadas e as que queiram se posicionar, basta enviar a Nota, devidamente assinada pelo responsável, ao e-mail da Redação em Brasília: valandre@agenciacarajas.com.br

Reportagem: Val-André Mutran – Correspondente do Blog do Zé Dudu em Brasília.

TCU autoriza renovação de Ferrovia Carajás e Pará perde acesso à ligação para a Norte-Sul


A Estrada de Ferro Carajás, explorada pela Vale no Pará, escoa a produção de minérios do Pará para exportação no Porto de Itaqui no Maranhão

A ferrovia é administrada pela mineradora Vale. Ramal no Pará, que ligaria a EFC à Norte-Sul, foi descartado pelo governo federal

Brasília – O Tribunal de Contas da União autorizou a renovação antecipada dos contratos de concessão das Estradas de Ferro Vitória a Minas (EFVM) e Estrada de Ferro Carajás (EFC). As duas ferrovias são administradas pela mineradora Vale. O ramal no Pará que ligaria a EFC à Norte-Sul foi descartado pelo governo federal.


Segundo o TCU, os novos contratos, mais modernos e alinhados aos interesses públicos, preveem investimentos de R$ 21 bilhões, sendo R$ 8,5 bilhões na EFVM e R$ 9,8 bilhões na EFC, além do uso do mecanismo de investimento cruzado, que permite usar parte do valor de outorga para a construção de novas ferrovias do Estado com investimento privado. A decisão não destinou nenhuma contrapartida ao Pará, enquanto o Mato Grosso será contemplado com uma nova ferrovia.


A decisão do TCU na quarta-feira (29) não teve repercussão entre os parlamentares paraenses até o final da noite, quando a reportagem do Blog do Zé Dudu foi fechada. As reações da Bancada do Pará, se houverem, serão conhecidas a partir da quinta-feira (30).


Ao todo, R$ 2,73 bilhões serão destinados à construção da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (FICO) entre Mara Rosa (GO) e Água Boa (MT). Esse trecho irá escoar a produção de grãos (soja e milho) do Vale do Araguaia, uma das maiores produtoras de soja do Brasil, até a Ferrovia Norte-Sul, criando acesso aos principais portos do país.


O aditivo ao contrato também prevê a construção de um trecho ferroviário entre Cariacica e Anchieta, no Espírito Santo, viabilizando a operação no Porto de Ubu. O Estado ainda pretende utilizar parte do valor arrecadado para a compra de material a ser utilizado na Ferrovia Oeste-Leste (FIOL), na Bahia.


Mapa das novas ferrovias

“É a consolidação de uma solução inovadora de fazer ferrovia no Brasil, sem a utilização de recursos públicos. O investimento cruzado, utilizando outorgas de concessões ferroviárias, é uma das principais estratégias do Governo Federal para dobrar a participação desse modo na matriz de transportes nacional. Estamos mostrando que a restrição orçamentária não será um impeditivo para desenvolvermos a infraestrutura do país,”, comentou o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas.


Para aquisição de frota das duas ferrovias, serão destinados R$ 2,8 bilhões e outros R$ 600 milhões serão reservados para obras de conflito urbano em 55 municípios. Além disso, R$ 11,3 bilhões serão investidos na manutenção da operação. O valor a ser pago pela Vale em outorga ao poder concedente será de cerca de R$ 2,2 bilhões por ambas as ferrovias.


Os estudos também apontam os benefícios socioeconômicos com a renovação dos contratos. Eles serão na ordem de R$ 1,7 bilhão, referentes à redução no custo de fretes e de custos externos de acidentes e ambientais. A realização dos investimentos previstos trará cerca de R$ 287 milhões aos cofres públicos, mediante arrecadação de tributos para os próximos seis anos. Além disso, é esperada a geração de 65 mil empregos. O prazo da renovação do contrato é de 30 anos.


A EFC e EFVM são consideradas as duas ferrovias mais seguras do país, com os menores índices de acidentes, e ocupam os dois primeiros lugares no Índice de Desempenho Ambiental Ferrovias, segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).




Histórico

A Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM) tem extensão total de 905 km e seu traçado percorre em boa extensão o Vale do Rio Doce. O principal produto escoado é o minério de ferro proveniente de Minas Gerais e destinado à exportação. Já a Estrada de Ferro Carajás (EFC), com 892 km de extensão, liga o Porto de Itaqui, no Maranhão, às províncias minerais da Serra dos Carajás, no Pará. Em Açailândia/MA conecta-se à Ferrovia Norte-Sul Tramo Norte, o que permite que as mercadorias possam acessar o Porto de Itaqui.



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