Editorial da Folha de S.Paulo hoje.
São Paulo, terça-feira, 29 de agosto de 2006
Parceria demorada
A QUEDA recorrente no investimento público e a elevação da carga tributária têm sido as principais variáveis do ajuste fiscal brasileiro. Com mais impostos e menos obras de infra-estrutura, o governo vem constituindo o superávit primário -a poupança cujo objetivo é conter a explosão da dívida pública. As despesas públicas em portos, estradas, ferrovias, saneamento etc. foram empurradas para níveis baixíssimos: no ano passado não chegaram nem a 1% do PIB.
Com poucas inversões públicas e privadas -estas inibidas pelos juros e pelos tributos exorbitantes-, os gastos a título de investimento produtivo na economia brasileira têm oscilado em torno de 20% do PIB. Essa taxa é insuficiente para libertar a economia do país da armadilha do baixo crescimento.
Diante da fragilidade financeira do setor público, o investimento em infra-estrutura só poderá voltar a se expandir a um ritmo considerável se contar com a participação de capital privado. Esse diagnóstico estava por trás da proposta das Parcerias Público-Privadas (PPPs), formulada no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso.
Tratava-se de desenhar um arcabouço jurídico capaz de atrair o capital privado para investimentos com prazo de maturação mais longo e risco mais alto. As PPPs se diferenciam tanto da obra pública, cujo risco é todo assumido pelo Estado, como das concessões, em que é transferido para as empresas privadas.
O longo processo de gestação do novo acervo regulatório parece que vai chegando ao fim. Após a aprovação da lei 11.079, no fim de 2004, foi estruturado o Fundo Garantidor de Parcerias Público-Privadas com dotação de capital de R$ 3,4 bilhões no ano de 2005. Finalmente, na segunda-feira passada, o Tesouro estabeleceu regras para o registro contábil dos projetos das PPPs.
Tome-se o caso hipotético de uma estrada construída nesse regime cujo contrato fixa o valor de R$ 100 milhões como a receita anual esperada do parceiro privado -a ser obtida com exploração do pedágio. Pode ocorrer, porém, que essa expectativa inicial se frustre, e o faturamento real venha a ser menor que o projetado. Nesse caso, a portaria assinada na semana passada autoriza o setor público a compensar a perda de recursos da empresa parceira repassando-lhe até R$ 40 milhões -ou 40% da receita anual esperada. Esse dinheiro sairá diretamente dos orçamentos públicos.
As regras para as parcerias entre governos e empresas têm demorado demais para ser explicitadas. Autoridades e especialistas dizem que esse tipo de inovação legal requer mesmo tempo para ser implementada; que esse foi o padrão nos países precursores, como o Reino Unido.
Mas, enquanto a discussão das PPPs no Brasil se arrastava, vale ressaltar, a capacidade do Estado de financiar infra-estrutura foi-se aproximando de zero. Que a fase de definição e execução dos projetos seja acelerada ao máximo daqui por diante. Não se pode mais admitir que as raras oportunidades de fomentar a economia sejam desperdiçadas.
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