Privatização: a verdade dos números
Artigo - MARIA SILVIA BASTOS MARQUES
O Globo 25/10/2006
O debate eleitoral trouxe novamente à tona a questão da privatização. Um debate de frases emocionais e vazio de conteúdo.
O processo de privatização, ocorrido nos anos 90, foi um dos mais importantes impulsionadores do crescimento e da modernização do país, bem como da inclusão social. Para não mencionar outros aspectos, como respeito ao meio ambiente, inovação tecnológica e aumento da concorrência e da qualidade de produtos e serviços - fortalecendo o papel do consumidor e a redução de preços.
A privatização, sempre em leilão público, abrangeu de siderurgia e mineração a bancos estaduais, telecomunicações, energia e aviação. Uma história de sucesso. E, ao contrário do que se diz, inteiramente alinhada aos interesses dos brasileiros.
Em diversos casos, como nos da CSN e Embraer, o Estado, através do Tesouro Nacional, deixou de custear empresas deficitárias e até pré-falimentares, liberando recursos para funções realmente públicas, como segurança, saúde e educação. Ademais, as empresas, então inadimplentes com os fiscos, fornecedores e empregados, passaram a gerar lucros expressivos e a recolherem regularmente impostos e contribuições, reforçando os recursos para o setor público. Para ilustrar, o prejuízo consolidado das empresas siderúrgicas em 1992 foi de US$260 milhões enquanto seu lucro consolidado em 2005 foi de US$4 bilhões.
Os investimentos, fundamentais para o crescimento do país, aumentaram significativamente, livres das amarras do Estado. Na siderurgia foram investidos US$16 bilhões após a privatização, em proteção ambiental, qualidade e modernização, preparando o setor para um novo ciclo de expansão da capacidade. A Vale do Rio Doce investirá US$4,6 bilhões em 2006, mais de dez vezes o valor investido em 1997. Sem mencionar a aquisição da mineradora canadense de níquel, Inco, por US$18 bilhões. O setor de telecomunicações investiu R$165 bilhões no período 1996-2005.
A Vale do Rio Doce, que possuía 11 mil funcionários em 1997, em 2006 tem 44 mil empregados diretos e 93 mil indiretos. Além disso, seus investimentos poderão criar 33 mil novos empregos diretos entre 2005/10, além do mesmo montante em empregos indiretos, ou seja, trata-se de 66 mil novos empregos. Os postos de trabalho no setor de telecomunicações, inferiores a 200 mil antes de 2000, hoje ultrapassam os 300 mil.
Do ponto de vista da responsabilidade ambiental, a mudança é paradigmática. As empresas estatais eram grandes poluidores do meio ambiente, negligenciando as proteções mínimas necessárias às suas atividades. A CSN, conhecida como "monstro do Paraíba", por despejar resíduos tóxicos no rio que abastece o Estado do Rio, tornou-se exemplo de respeito ao meio ambiente após investir centenas de milhões de dólares em equipamentos preventivos e em recuperação de áreas degradadas. A Cosipa fez igualmente investimentos significativos, tornando uma história do passado os graves problemas decorrentes do descaso ambiental da então empresa estatal.
Do ponto de vista da inclusão social, o caso das telecomunicações é único no mundo. Em menos de uma década reverteu-se um quadro pré-histórico, em que para ter um telefone era preciso pagar uma assinatura cerca de cinco anos, sem a garantia de ter a tão sonhada linha. A linha era um ativo tão caro que era declarada no Imposto de Renda! Claro que somente as classes A/B tinham acesso a este serviço. Hoje os serviços de telecomunicações (fixo, móvel, TV por assinatura e banda larga) são prestados a 141 milhões de brasileiros. A base de clientes de telefones celulares cresceu mais de 1300%, de 7 milhões em 1998 para cerca de 100 milhões atualmente. Ainda mais importante: desse total, 60 milhões são das classes C/D/E. Como essa população não tinha acesso a esses serviços, tem-se o maior instrumento de inclusão social já visto neste país. Em relação ao acesso fixo ou celular nas residências, em 1998 apenas 32% tinham acesso aos serviços. Em 2005, 72% dos domicílios já desfrutavam desses serviços - um espetacular aumento de 124%.
A maior competição e concorrência, com a vinda de novas empresas para investir e operar no país, e a competição entre empresas privatizadas, como na siderurgia e telecomunicações, antes sob o guarda-chuva de cartéis estatais (Siderbrás e Telebrás), fortaleceram o papel do consumidor e reduziram preços de produtos e serviços. Tudo isto aliado a um inequívoco aumento na qualidade dos mesmos.
O processo de privatização também teve forte impacto na profissionalização da gestão das empresas, movimento que se espalhou por toda a economia, com reflexos positivos na governança, no respeito à comunidade, ao meio ambiente, empregados, fornecedores, clientes e acionistas. Estas mudanças também se refletiram no fortalecimento do mercado de capitais, com a forte elevação do valor de mercado das empresas agora privadas.
MARIA SILVIA BASTOS MARQUES foi diretora financeira do BNDES, secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro e presidente da Companhia Siderúrgica Nacional
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