Um sumidouro

O Brasil precisa de vereadores?

Número de vereadores cai, mas custos aumentam

Paulo Henrique Lobato Correio Braziliense 20/11/2006

Mesmo depois dos cortes no número de cadeiras, gastos com as câmaras de vereadores no país subiram R$ 400 milhões. Explicação está na continuidade dos repasses e no “esforço” em gastar dinheiro público

A redução de 8.481 vereadores no país nesta legislatura (2005/2008) não se refletiu nos gastos das 5.562 câmaras municipais. Pelo contrário: houve aumento de custos de R$ 400 milhões (7,58%). Em Minas Gerais, onde o corte foi de 1.240 cadeiras, a cifra à disposição dos vereadores cresceu R$ 67,8 milhões (13,78%). Os dados foram levantados pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam) e se referem à comparação entre o ano passado e 2004, quando a polêmica portaria publicada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou a recomposição do número de parlamentares municipais no Brasil. A explicação para tal absurdo está na manutenção do volume de recursos públicos destinados às câmaras e na sanha dos vereadores em gastar.

Em 2004, antes do corte nas cadeiras, as câmaras brasileiras gastaram R$ 4,9 bilhões com a função legislativa, o que inclui subsídios dos vereadores, pagamento de servidores, contas de água e luz, manutenção de veículos e outras despesas. Um ano depois, quando várias cidades reduziram o número de parlamentares, o valor subiu para R$ 5,3 bilhões. Em Minas, no mesmo período, o gasto passou de R$ 491,4 milhões para R$ 559,2 milhões.
“O custo da função legislativa em 2005 era aguardado por diversos segmentos da sociedade, vez que a decisão do TSE, culminando na redução de vereadores, gerou expectativa de que o gasto seria reduzido na mesma proporção. Mas ocorreu o contrário”, reforça o economista François Bremaeker, coordenador do estudo.

Bremaeker explica que o aumento se deve, em parte, ao crescimento do orçamento das prefeituras. Isso porque os repasses do Executivo ao Legislativo são vinculados por lei e oscilam de 5% a 8%. “As prefeituras repassam às câmaras 8% do orçamento em cidades com até 100 mil habitantes, 7% até 300 mil moradores, 6% até 500 mil pessoas e, acima deste universo, 5%”, acrescenta.

Na prática, houve redução no número de parlamentares, mas a legislação do repasse não sofreu alteração. O Senado, em 2004, tentou votar um projeto que reduzia esses índices em 0,5%, mas não houve acordo. A decisão do TSE abriu margem para que parlamentares reajustassem os próprios contracheques e aumentassem a chamada verba de gabinete, a ajuda de custo. Na histórica Ouro Preto (MG), berço da Inconfidência, os 17 parlamentares da legislatura passada perderam sete cadeiras a partir de 2005, mas o salário subiu de R$ 2,6 mil para R$ 3,8 mil entre a última legislatura e a atual.

Orçamento gigante
Os 5.562 municípios brasileiros tiveram à disposição orçamento gigantesco em 2005, da ordem de R$ 148,6 bilhões. As despesas com as câmaras somaram R$ 5,3 bilhões, o que representa 3,56% do erário municipal. Em 2004, quando os prefeitos tiveram R$ 145,5 bilhões, esse percentual havia sido de 3,38% (R$ 4,9 bilhões). Em nível regional, a oscilação em torno da média brasileira na participação dos gastos dos legislativos é relativamente pequena. As câmaras da região Sudeste apresentam resultado abaixo da média: 3,09%. Já as das casas das demais áreas superam o índice, sendo 3,95% na Sul, 4,13% na Nordeste, 4,22% na Centro-Oeste e 4,32% na Norte. A relação entre a despesa do legislativo com o orçamento da prefeitura chega a um percentual médio de 5,08% nos municípios com até dois mil moradores. O índice diminui à medida em que aumenta o universo de habitantes.

“A distribuição média na participação relativa dos gastos das câmaras, segundo os grupos de habitantes, mostra que as oscilações em torno dessta média são um pouco maiores que aquelas encontradas nas grandes regiões. A participação das despesas com a função legislativa supera a média nacional para os municípios com população até 100 mil habitantes, sendo que essas participações declinam à medida em que aumenta o porte demográfico das cidades”, explica Bremaeker.

LINHA DE PESQUISA
A metodologia usada pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam) teve como base uma amostra de 3.691 municípios, o que corresponde a 66,36% das 5.562 cidades do país. De posse das planilhas consultadas junto à Secretaria do Tesouro Nacional, o Ibam projetou os gastos para as demais câmaras. Em Minas, foram 618 das 853 câmaras, ou 72,4% do total. “Em razão das dificuldades quanto ao detalhamento desses dados, foi utilizado aquele referente aos gastos totais com a função legislativa e efetuada sua comparação com o total da despesa orçamentária municipal”, acrescenta François Bremaeker, coordenador da pesquisa.
A decisão do tse de reduzir vereadores gerou expectativa de que o gasto também seria reduzido. ocorreu o contrário

O número
7,58%
Foi o percentual de aumento de gastos nas câmaras de vereadores
Verbas “sobrando” para investimento

Em 2004, por intermédio de uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi determinada a redução do número de integrantes das câmaras municipais, que ocorreu na posse das atuais legislaturas, em janeiro de 2005. Apesar da diminuição dos vereadores, não houve nenhuma alteração no volume de recursos públicos destinados às casas legislativas. Com isso, criou-se uma situação esdrúxula — enquanto os poderes Executivo e Judiciário continuam a reclamar da falta de verbas, nas câmaras municipais, o que se viu foi um verdadeiro “esforço” para consumir todo o dinheiro previsto e em seus orçamentos e não ter que devolver recursos para as prefeituras.

Com o dinheiro “sobrando”, muitas câmaras municipais investiram na compra de computadores e veículos e até na construção de novas sedes. Outras, além da “melhoria da infra-estrutura”, optaram pelo aumento das despesas com os vereadores. Em Montes Claros (MG), com 336 mil habitantes, o número de vereadores, que era de 21, caiu para 15 em janeiro de 2005. Mas o orçamento da casa continuou inalterado, da ordem de R$ 5,9 milhões por ano.

O salário dos vereadores, que até 2003 era de R$ 4,5 mil mensais, atualmente é de R$ 6,678 mil por mês. Mensalmente, cada vereador tem direito ainda a R$ 7 mil para contratação de pessoal — com o montante, podem contratar quantos assessores quiserem, desde que paguem pelo menos um salário mínimo por pessoa — e R$ 5 mil de verba indenizatória, usada para a quitação de contas de telefones, correspondências, gasolina e outras despesas. Essa verba foi o pivô do escândalo em que se envolveu a câmara municipal em julho deste ano, quando oito dos 15 vereadores foram presos na operação “Pombo Correio” da Polícia Federal, suspeitos de desviar recursos públicos com o uso de recibos adulterados dos Correios. O presidente da Câmara Municipal de Montes Claros, Ildeu Maia (PP), reconhece que houve o aumento de despesas com o pessoal e com custeio, tendo feito gastos também na compra de computadores e outros equipamentos. Mas nega que tenha existido abusos por causa da “sobra” de recursos.

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