Sem agenda

O presidente Lula criou as condições para fazer um segundo mandato melhor que o primeiro?

NÃO

Mais do mesmo?

GUSTAVO FRUET

O "NÃO" que norteia este texto tem caráter construtivo, contra o conformismo. Mas uma pergunta se impõe: qual é a agenda para os próximos quatro anos? Toda reflexão a esse respeito levará à conclusão de que o governo continua se afirmando mais como símbolo de possibilidades, na forte imagem do presidente Lula, do que como condutor de um programa consistente e previsível, capaz de levar o país ao desenvolvimento sustentado.
O adiamento da divulgação do pacote do crescimento é mais um sintoma de que o governo não dispõe de um projeto, nem mesmo de um conjunto de prioridades. Ao mesmo tempo, observa-se a continuidade de atritos e disputas no governo, como se viu na definição do salário mínimo. Nada indica que daqui a dois ou três anos o Brasil deixará a constrangedora posição que ocupa no ranking do crescimento. Os anos recentes ofereceram ao país condições muito favoráveis, difíceis de serem repetidas no cenário internacional. Os bons ventos sopraram sem que o governo enfrentasse desafios, como a definição de marcos regulatórios -cuja fragilidade está expressa na lentidão das PPPs-, a garantia da estabilidade de regras e a retomada de investimentos continuados em infra-estrutura.
O resultado é um país travado, como afirma o próprio presidente, numa confissão involuntária do que foi seu primeiro governo, feita durante encontro com lideranças de movimentos sociais, em dezembro: "Neste mandato vou destravar o Brasil".
A trava resulta da opção do governo, que respaldou o aperto monetário proposto pelos ministros e anunciado aos mercados como bandeira pacificadora. O controle inflacionário é um sucesso que poucos comemoram, pois os juros continuam inibindo os investimentos públicos e privados. A dívida pública cresce e o déficit nominal não é reduzido. Mais aperto, mais encargos, menos investimentos e infra-estrutura precária, que só não chegou à total ruptura porque as taxas de crescimento são baixas.
O setor de energia, vital para sustentar o crescimento, continua com incertezas e previsões sombrias. As rodovias, caóticas, alimentam o noticiário com o escândalo da operação tapa-buracos e os acidentes. O apagão aéreo é a crise de gestão que veio à tona com a tragédia que levou 154 vidas e se arrasta sem solução.
De concreto, a manutenção do superávit primário nas alturas para pagar os juros. Adicionalmente, ou por isso mesmo, o governo não estabeleceu, como prometera, uma política de controle do capital externo de curto prazo. Mais: nosso empresariado está preferindo investir noutros países. Os investimentos brasileiros no exterior cresceram 226% em 2006. Seria boa notícia se não resultasse, em grande parte, da necessidade de buscar um ambiente econômico menos hostil.
Sob o aspecto político, desenvolveu-se uma prática para, ao mesmo tempo, financiar e controlar os partidos, contaminando um Congresso com defesas muito baixas. Não importa quem contaminou quem: o casamento das velhas práticas com as "novas" teve o efeito de uma bomba moral no Congresso. Deixou as paredes do edifício em pé, deixou até pessoas em pé, mas detonou a credibilidade da instituição. A quem interessa um Parlamento enfraquecido?
Agora, fala-se em coalizão para o ministério. Em que bases? Ao preço de reforçar na opinião pública a idéia de que todos são iguais, o presidente conseguiu se descolar dos escândalos.
Aprenderam com as lições deixadas por episódios como mensalão e sanguessugas? A chamada coalizão privilegia cargos e pacotes em lugar de uma agenda e de reformas efetivas. Haverá aparelhamento? Redução da carga tributária? Reforma política? Segurança? O que pensa o governo?
Mais uma vez, prevalece a retórica. O fato é que Lula ganhou o segundo mandato de um país dividido. Há anestesiados e indignados nessa história. E questões a serem esclarecidas em investigações que continuam após as CPMIs. Mas há também desafios. A partir de janeiro se verá como se conciliam essas contradições e dúvidas com a fantasia do mágico crescimento econômico de 5%.


GUSTAVO FRUET, 43, doutor em direito pela Universidade Federal do Paraná, é deputado federal (PSDB-PR).

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