REVES E DÍVIDAS LEVAM CAOS AO GOVERNO DE AL |
César Felício |
Valor Econômico |
6/3/2007 |
Na apertada Praça Floriano Peixoto, em Maceió, o neoclássico Palácio dos Martírios deixou de ser a sede do governo alagoano há pouco mais de um ano. O atual governador Teotônio Vilela Filho (PSDB) despacha atualmente a poucos metros da construção anterior, em um moderno bloco de concreto, esquadrias metálicas e vidro fumê pomposamente batizado de "Palácio Zumbi dos Palmares", inaugurado pelo antecessor Ronaldo Lessa. O cenário é uma das poucas mudanças da atual falência anunciada do Estado, em relação às quebras anteriores, em 1997 e 1986. Mais uma vez, o governo estadual se declarou incapaz de arcar com seu próprio peso. O ano letivo ainda não começou para os cerca de 170 mil alunos da rede estadual de ensino. Em greve desde o início do ano, os professores agora batalham contra o governo tucano no Judiciário para impedir a declaração da ilegalidade do movimento. Alagoas ficou em 20º lugar entre os Estados na avaliação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no ano passado. No Nordeste, ganhou apenas do Maranhão. Segundo avaliação do governo estadual, um aluno de oitava série da rede estadual do ensino reúne conhecimentos equivalente ao aluno da terceira série do ensino fundamental no Distrito Federal. Maceió é a capital brasileira que ostentou em 2005 o mais alto índice de crimes violentos do país, segundo levantamento do Ministério da Justiça, mas a precariedade do Estado contaminou a segurança. Há problemas de falta de estrutura e descontrole gerencial. Em Limoeiro da Anadia, cidade do sertão alagoano, um grupo de dez homens armados assaltou uma agência do Banco do Brasil e uma casa lotérica na quinta-feira. O efetivo policial local é composto por apenas dois homens, ambos na zona rural do município quando ocorreram os crimes. O Estado tem um histórico de envolvimento do aparelho policial com o crime organizado. Em 1999, a CPI do Narcotráfico trouxe relatos de que 80% dos crimes no Estado tinham participação da área de segurança. O próprio governador admite a necessidade de realizar uma depuração no setor, e com este espírito nomeou um general de exército, Edson Sá Rocha, como secretário. Mas em confronto com os professores, o governo estadual tem dificuldades de abrir uma nova frente de atrito. O estopim da atual crise está na concessão de aumentos salariais dados no ano passado pelos antecessores de Teotônio, Ronaldo Lessa (PDT), que se desincompatibilizou para tentar, sem sucesso, a eleição ao Senado e Luiz Abílio (PDT), que assumiu por oito meses. Os aumentos, parcelados e que seriam concluídos no início deste ano, fariam a equiparação dos vencimentos entre os servidores com e sem diploma que exercem a mesma função. Além dos 46 secretários, até o Comandante do Corpo de Bombeiros tinha cargo de 1º escalão Segundo dados que o governo estadual irá apresentar ao Tesouro Nacional, o gasto em 2006 com pessoal, aí incluídos os ativos e inativos de todos os poderes, passou de R$ 1,328 bilhão para R$ 1,649 bilhão entre 2005 e 2006. Em relação à receita bruta do Estado, a variação foi de 53,4% para 60,19%, ligeiramente acima do máximo de 60% estipulado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Ao assumir, Teotônio adotou um tratamento de choque: suspendeu a isonomia concedida aos servidores, inclusive a parcela de 20% já paga desde o ano passado. A meta era retomar a capacidade do Estado de gerenciar políticas públicas. "O Estado ficou incapaz de dar as contrapartidas aos programas federais e manter-se adimplente para poder buscar dinheiro novo, que são as formas existentes aqui para investir", diz o governador. Além do aumento da folha, Teotônio divulgou um pacote de pendências deixadas pelo governo anterior: R$ 40 milhões em apropriação indébita de parcelas de empréstimos consignados de servidores que não foram repassados para o sistema financeiro, R$ 41 milhões de recursos do Fundef não repassados para municípios, atraso de R$ 15,1 milhões no repasse do ICMS, dívidas de restos a pagar de R$ 45 milhões, empenhos liquidados e não pagos de R$ 75 milhões. A soma de todos os débitos chega a aproximadamente R$ 280 milhões. Para dramatizar a situação, definida por Teotônio como "um Estado de calamidade, sem trocadilho", foi incluído na relação até um compromisso ainda não vencido no dia da posse, que era a folha de pagamento de R$ 120 milhões, referente a dezembro e a resíduos do 13º . Teotônio fez uma moratória branca: expurgou o aumento da folha e suspendeu o pagamento das demais dívidas por 120 dias. Diante da reação do funcionalismo, Teotônio recuou ainda em janeiro e aceitou repor até 60% dos aumentos. Fechou o acordo com os profissionais da saúde e da segurança pública, mas não com a maior categoria do Estado, o professorado, cuja base é de 20 mil profissionais na rede estadual. O impasse pode terminar nos próximos dias e a primeira alteração no secretariado em Alagoas sinaliza para isso. Na sexta-feira, Teotônio tirou da Secretaria da Administração o executivo André Vajas, que trabalhava em uma das empresas de seu cunhado, o senador João Tenório e nomeou o seu advogado, Adriano Soares, que ocupou o mesmo cargo no governo Lessa. A área de comunicação do governo faz uma ofensiva para tornar impopular a greve. Como o governo de Luiz Abílio estava com o pagamento do funcionalismo em dia, disseminou-se na população a imagem de que Teotônio não dá prioridade à educação. Peças comerciais na televisão de até 1 minuto e 45 segundos de duração acusam os grevistas de intransigência, jogam sobre eles a responsabilidade pelo atraso no ano letivo e argumentam que o professor em Alagoas tem o maior salário do Nordeste - R$ 829 de remuneração básica bruta. O governador também procurou amplificar a exposição das mazelas encontradas na administração do ex-aliado Ronaldo Lessa. Entre elas, o fato de a antiga equipe ser composta por nada menos que 46 secretarias de Estado, divididas em "células administrativas". Na complexa estrutura montada por Lessa, cargos como o de comandante do Corpo de Bombeiros tinham status de primeiro escalão. A constante troca de secretários fez com que seu governo fosse apelidado pela imprensa de oposição de "ronaldízio". A equipe caiu para 17 secretarias. Lessa não contesta a maioria das dívidas, mas afirma que o atual governador estava ciente de que o governo passado concederia aumentos a serem pagos este ano e que omite receitas para carregar nas tintas . "Está documentada a concordância de Teotônio com a isonomia", diz Lessa. O pedetista relaciona um recebível de R$ 70 milhões da Petrobras, ganhos judiciais em relação a dívida do Estado de R$ 84 milhões e ativos a vender do extinto banco estatal Produban de R$ 30 milhões como alternativas . "Falta buscar de R$ 40 a R$ 50 milhões para fechar as contas. Isto não é nada", minimiza . |
Como se quebra um Estado
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