Stálin invade as livrarias
Revisionismo ou curiosidade histórica?
A abertura de arquivos podem explicar a série de lançamentos que tem um dos líderes da Revolução Russa como tema central dos debates, no momento em que se tem acesso a importantes arquivos do período, até recentemente inacessíveis. Quando foram abertos, nos anos 90, os arquivos secretos da União Soviética revelaram uma quantidade enorme de informações sobre os anos da guerra fria. E não demorou para que os documentos se transformassem em livros sobre alguns dos principais atores do período, assinados pelos primeiros historiadores que a eles tiveram acesso. Entre eles, o britânico Simon Sebag Montefiore e os irmãos russos Roy e Zhores Medvedev dedicaram-se a compor novas biografias do georgiano Josef Stalin. Os dois livros chegaram ao mercado editorial brasileiro nos últimos dois meses. Agora, a Civilização Brasileira coloca nas livrarias Stalin:Uma Biografia Política, clássico estudo do polonês Isaac Deutscher; e a José Olympio anuncia a compra dos direitos de Os Ditadores: A Alemanha de Hitler/ A Rússia de Stalin, de Richard Overy. Coincidência ou há um interesse crescente do mercado editorial pela figura de Stalin? O livro de Montefiore, A Corte do Czar Vermelho (Companhia das Letras, 864 páginas) tem como tema a rotina de Stalin e se apóia em documentos como cartas, bilhetinhos, anotações às margens de livros, minutas de reuniões, agendas e papéis que passavam todos os dias pela escrivaninha do ditador que comandou o Estado comunista entre 1941 e 1953. Já os irmãos Medvedev, em Um Stalin Desconhecido (Record, 448 páginas), reúnem ensaios sobre temas específicos, como a corrida atômica ou a ciência soviética, por exemplo. Isaac Deutscher segue em outra direção. Seu estudo sobre Stalin foi lançado no fim dos anos 40 e, ao lado da biografia de Trotski, fez do autor um dos grandes especialistas em história soviética. Nele, apresenta as principais bases e crenças da atividade de Stalin, que define como 'o líder e explorador de uma trágica, contraditória, mas criativa revolução'. Maria Amélia Mello, diretora editorial da José Olympio, não vê uma tendência de mercado necessariamente ligada à figura de Stalin. Acredita, em especial, que biografias vendem e que os personagens da 2ª Guerra Mundial, 'por ser um episódio fundamental para a compreensão da história moderna', atraem os leitores. No mesmo caminho segue Rosemary Alvez, diretora editorial da Bertrand Brasil, que anuncia a compra dos direitos da biografia de Lênin assinada por Robert Service que, com ela, ganhou o prêmio Foreword Magazine´s History Book of the Year. De volta a Stalin, o historiador da Universidade de São Paulo Elias Thomé Saliba coloca como dado importante a abertura dos arquivos soviéticos, que começou pela extinção da Glavit, a agência cujo selo de aprovação tinha de estar presente em tudo o que contivesse palavras impressas, e seguiu com a liberação de grande parte dos arquivos da KGB. É um processo que ainda está em curso em toda a Rússia, em especial com a abertura de outros arquivos estatais. Livros como o de Montefiore e Medvedev seriam apenas o começo. 'O exame desta documentação é muito lento e depende de análises comparativas com outros arquivos, instrumentos heurísticos para estabelecer autenticidade, etc. E muita coisa certamente deve surgir. O diário manuscrito da prisioneira política dos campos stalinistas Nina Lugvoskaia, lançado no ano passado aqui no Brasil pela Ediouro, foi descoberto por acaso no meio da papelada antibolchevique amealhada nos arquivos da KGB', diz o historiador, que chama atenção também aos arquivos de fora da Rússia. 'Na Polônia, por exemplo, há muito o que tirar dos fragmentos que sobraram.' Prova disso é Levante de 44, livro de Norman Davies, que a Record acaba de lançar e que se utiliza de uma série de testemunhos diretos, entre eles o caderno da polonesa Janina Bauman (lançado no ano passado no Brasil pela Jorge Zahar, com o título de Inverno na Manhã).
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