Melhorar a qualidade da representação política
Antonio Carlos de Mendes Thame*
O atual sistema de eleição de deputados federais e estaduais apresenta dois graves inconvenientes: o elevado custo das campanhas eleitorais e a diluição da representatividade, em decorrência da dispersão geográfica e da diversidade de reivindicações e demandas políticas daí advindas. Em virtude desse afastamento, o acompanhamento e a cobrança das atividades dos deputados eleitos praticamente inexiste.
Tomemos o Estado de São Paulo, como exemplo. Um candidato a deputado estadual ou federal deve comunicar que é candidato para quase 30 milhões de eleitores. Só para isso, só para contar que é candidato, o custo já é extremamente alto. Fazer campanha em todo o Estado é desumano. Caro e desumano. Candidatos por isso perdem grande parte do tempo procurando empresas para financiar sua campanha. Tempo que seria mais bem empregado para apresentar propostas e manter contatos diretos com os eleitores. Além disso, poder ser votado em regiões distantes do seu domicílio eleitoral contribui para piorar a qualidade da representação política, pois permite o voto em quem não se conhece. Alguns deputados acusados de receber mensalão ou de serem "sanguessugas" tiveram pequena votação no seu domicílio eleitoral, mas foram reeleitos em 2006, porque tiveram votos espalhados por todo o Estado. Como isso foi possível? Realizando campanhas caríssimas, contratando " cabos-eleitorais" em todo estado para obter votos junto a eleitores com os quais não tem identidade. Se só pudessem ser votados no distrito em que moram, dificilmente seriam eleitos.
Por outro lado, há ampla polêmica quanto ao novo modelo a ser adotado. Pelo menos duas alternativas vêm sendo discutidas nos últimos dias. Uma delas é a lista fechada. O eleitor passaria a votar em listas elaboradas pelos partidos. Essa proposta permitiria o financiamento público das campanhas, já que só os partidos receberiam recursos. Fortalece os partidos, mas tira do eleitor a possibilidade de escolher o seu deputado. Coloca nas mãos da burocracia partidária toda a força para indicar os que serão eleitos. Os primeiros nomes da lista deverão ser os mais conhecidos, servindo para "puxar" votos. O terceiro, o quarto, o quinto nome, porém, poderão ser fruto de barganhas espúrias, trazendo para dentro do partido um processo de degradação e corrupção. Além disso, invariavelmente, dificultaria muito a renovação e o surgimento de novas lideranças.
A alternativa apresentada é a do voto distrital. Com o voto distrital puro, dividindo o Estado de São Paulo, cuja bancada federal é de 70 deputados, em 70 distritos, cada distrito elegeria um deputado pelo sistema majoritário. Tem inegáveis vantagens: aproxima o eleitor dos eleitos, dimunui o custo das campanhas e facilita o acompanhamento e fiscalização dos trabalhos dos eleitos. O inconveniente, porém, é que isso exige uma emenda à Constituição Federal, com aprovação pelos votos de três quintos da Câmara e do Senado, em duas votações.
Outra hipótese é a do voto distrital misto: uma parte, digamos 80% das cadeiras, seriam disputadas nos distritos e 20% seriam preenchidas por lista fechada dos partidos.
Assim como no caso do distrital puro, a mudança para distrital misto também exige mudança na Constituição Federal.
Para contornar esta dificuldade, apresentei o projeto de lei 7537/06, instituindo o voto proporcional distrital. A proposta mantém o sistema proporcional, sendo que cada estado Definirá o número de distritos. Teríamos, no mínimo, dois eleitos em cada distrito e, no máximo, o correspondente à metade das cadeiras disputadas. Por exemplo: São Paulo, com 70 deputados federais, poderá ter no mínimo dois ou no máximo 35 distritos, de tal forma que em nenhum distrito haja a disputa de apenas uma cadeira. Se tivéssemos, por exemplo, sete distritos, cada um elegeria 10 deputados federais. Tal modelo não impede a eleição de candidatos temáticos que, sem identificação com temas locais, teriam maior dificuldade de serem eleitos em uma eleição distrital pura. Combina-se a possibilidade de eleger candidatos de fato próximos a uma dada base eleitoral, conhecido por seus eleitores até pessoalmente, com a possibilidade de preservar a candidatura de quem fizesse sua campanha em base a temas que empolgassem o eleitorado, pois se houvesse mais de um bom candidato na circunscrição, os mais bem votados seriam eleitos, e não apenas um único mais bem votado de todos.
Dessa forma, poderão ser diminuídos imensamente os custos das campanhas. Com sete distritos, em São Paulo, estaríamos diminuindo em 85% estes custos. Com 10 distritos, diminuindo em 90%! O voto proporcional distrital agregaria três expressivas vantagens: a proximidade do eleitor com os candidatos, a maior fiscalização da atuação dos eleitos e a redução dos custos de campanha.
Esse é um projeto factível, por não exigir emenda constitucional. Pode ser aprovado por lei ordinária. O projeto não contraria o sistema proporcional determinado pela Constituição da República, apenas modifica o critério para delimitar as circunscrição eleitorais, razão pela qual sua aprovação implica a revogação do artigo 86, da Lei n.º 4.747, de 15 de julho de 1965. É um projeto que só tem vantagens. Há quem alegue dificuldades para definir o tamanho dos distritos, inconveniente que também teria que ser enfrentado no caso do voto distrital puro ou misto.
A proposta é de grande simplicidade, resumindo-se, na prática, à redução da abrangência do Colégio eleitoral, que hoje são os estados, para circunscrições, distritos eleitorais menores em que os e estados se subdividirão.
Por último, há críticos que reconhecem a vantagem do voto proporcional distrital, porém acham necessária uma reforma mais radical. Nossa contestação é que o importante é mudar para melhor. Mesmo que não se corrijam todos os problemas , enquanto o voto em lista é um " tiro no escuro", contendo incógnitas que podem transformá-lo em brutal retrocesso, o voto proporcional distrital significa um concreto avanço, com vantagens inegáveis.
Antonio Carlos de Mendes Thame é deputado federal (PSDB/SP) e professor (licenciado) do Departamento de Economia da ESALQ/USP.
e-mail: dep.mendesthame@terra.com.br
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