A Federação brasileira comporta novos Estados?

O jornal Folha de São Paulo deste sábado (14/05/2011) pergunta, na Coluna Opinião (pág.3):
A Federação brasileira comporta novos Estados?

SIM

GIOVANNI QUEIROZ

Instrumento de integração nacional

Resumir a criação dos Estados de Carajás e Tapajós no Pará em "mais gastos para o governo e prejuízos para o contribuinte" não é apenas precipitado, mas pode ser considerado também um raciocínio simplista. Por essa ótica, deixam-se de lado exemplos exitosos ocorridos ao longo da história e tudo o que de positivo isso representaria para o desenvolvimento daquelas áreas, do Pará e da região amazônica.Antes de fazer essa avaliação, é necessário compreender que a criação dos novos Estados não se resume a uma simples redivisão do espaço territorial ou mesmo prejuízo para o Estado redimensionado.
Os exemplos de desmembramentos, como os de Mato Grosso do Sul e Tocantins, são laboratórios a céu aberto à disposição de cientistas políticos, economistas, sociólogos e a quem mais do meio acadêmico possa interessar a análise.
Fazendo uma comparação da evolução do PIB de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, de 1977 (data do desmembramento) a 2008, a preços constantes de 2000, segundo os dados do IBGE,verifica-se uma evolução de 723%, enquanto o PIB nacional cresceu 251%, no mesmo período.
Os Estados de Tocantins e Goiás, de igual forma, de 1988 a 2008 ,tiveram juntos o PIB elevado em 194%, enquanto o do Brasil cresceu 76%.
Outro dado positivo diz respeito ao Amapá, que de território passou a Estado e teve o crescimento do PIB em 187%.
Na área estruturante, o Tocantins, que era o corredor da miséria goiana, em 22 anos de existência saltou de 110 quilômetros de rodovias estaduais para 6.110 quilômetros de estradas pavimentadas.
Para se ter uma ideia do que isso representa, o Pará, que tem cinco vezes o território e seis vezes a população do Tocantins, tem apenas 5.000 quilômetros de rodovias.
Outro dado importante é o fato de 85% das residências do Tocantins terem hoje água tratada, potável, enquanto no Pará apenas 50% das casas têm água encanada, de acordo com o Ipea.
Isso reflete a melhoria da qualidade de vida da população como uma consequência direta do desmembramento.
A educação também merece destaque. Há 22 anos, não havia no Estado uma só sala de nível superior; hoje, ele abriga cinco faculdades de medicina, sem falar dos demais cursos, enquanto o Pará conta com três faculdades de medicina, em mais de 150 anos como Estado.
É verdade que a criação de Carajás e de Tapajós vai implicar gastos iniciais, com as novas estruturas burocráticas a serem implantadas: novas casas legislativas, governos, servidores. Mas esses gastos trarão para a população benefícios muito maiores, da mesma forma que ocorreu no Tocantins.
O Estado do Carajás não dependerá de repasses federais, pois tem hoje estrutura muito superior à do Tocantins à época de sua criação.
Concordar com a não viabilidade de criação dos novos Estados e acreditar que os gastos vão superar o ganho para a região e, principalmente, para a população é ignorar a realidade do Pará e posicionar-se por puro preconceito.
É dar as costas para o desenvolvimento econômico e social do país.
É manter os olhos fechados para extremas desigualdades entre os Estados brasileiros.

GIOVANNI QUEIROZ é deputado federal pelo Pará e líder do PDT na Câmara dos Deputados.


NÃO

Territórios seriam menos danosos

CLÁUDIO GONÇALVES COUTO

A possível criação de três novos Estados na Federação, a partir da divisão do Pará, não é um assunto que interesse apenas aos (por enquanto) paraenses.
Trata-se de questão do máximo interesse de toda a população brasileira, pois a divisão de unidades federativas traz implicações não somente para as populações que nelas vivem, mas para o país como um todo. As razões são tanto de natureza política como econômica, pois, se tal divisão vier a ocorrer, todos os demais Estados serão prejudicados política e economicamente.
O prejuízo econômico adviria dos inevitáveis custos que a criação de novos Estados acarretaria.
Segundo cálculos feitos por Rogério Boueri, economista do Ipea, o custeio das duas novas unidades federativas custaria anualmente, já de saída, no mínimo R$ 2,2 bilhões para Tapajós e R$ 2,9 bilhões para Carajás. Como suas arrecadações não seriam suficientes para cobrir tal custo, a União teria de repassar-lhes R$ 2,16 bilhões, todos os anos.
Sem contar ainda os custos de investimento, já que diversas obras públicas de infraestrutura teriam de ser feitas, desde a construção dos edifícios governamentais até a base de transportes.
A esses custos "locais" devem-se acrescer os gastos dos novos Estados fora de seus territórios, com seus novos deputados e senadores, assim como seu respectivo espaço físico e funcionários.
Já o prejuízo político adviria do aumento do desequilíbrio de representação no Congresso Nacional. Hoje o Pará conta com 17 deputados federais e três senadores; com a divisão, passariam a 24 deputados e nove senadores.
A região Norte do país, hoje já bastante super-representada, ficaria ainda mais, e o valor relativo dos eleitores viventes em outras unidades federativas, mais populosas, tornar-se-ia ainda mais diminuto.
Haveria também o problema de definir como absorver os novos membros no Congresso, pois, embora o mais provável seja aumentar o número de cadeiras, alguns defendem a diminuição da representação de alguns Estados. Aí a situação se tornaria ainda pior quanto à equidade representativa.
Certamente, a população do Pará que vive nas regiões a serem divididas tem seus motivos para defender a divisão, assim com o têm (ainda mais) as elites políticas patrocinadoras da consulta.
Cidadãos dos virtuais Estados de Tapajós e de Carajás queixam-se que sua distância com relação à capital do Estado é causa da desatenção do poder público estadual a seus reclamos e necessidades.
Para muitos que vivem em Tapajós, por exemplo, as relações são mais estreitas com Manaus que com Belém -o que dá boa indicação do tamanho do problema.
A questão é saber se a criação de novos Estados é a única saída possível. Uma solução que tem sido diligentemente ignorada em casos como estes é a de dividir Estados existentes não para criar Estados novos, mas territórios federais -uma entidade territorial prevista constitucionalmente, mas que tem sido mera figura de ficção legal.
A Carta Magna prevê a criação de territórios como algo possível a partir do desmembramento de Estados. Os territórios seriam parte da União, mas poderiam futuramente ser reintegrados a seus Estados de origem, se as condições políticas se tornarem favoráveis a isso.
Essa saída, contudo, não tem interessado às elites políticas locais, pois diminui o tamanho de seu botim: em vez de oito novos deputados por novo ente, seriam apenas quatro; não haveria senadores; o governador seria indicado pelo governo federal e responsável perante ele. E, claro, os custos seriam muito menores, além de não se causar um desequilíbrio federativo como o provocado pela criação de Estados.
Se o resto do país se dispuser a aceitar a divisão, deveria exigir que fosse por territórios federais.

CLÁUDIO GONÇALVES COUTO, cientista político, é professor do Departamento de Gestão Pública e da pós-graduação em administração pública e governo da EAESP-FGV (Fundação Getulio Vargas).

5 comentários:

Roberto C. Limeira de Castro disse...

Como um doutor, dito formado por tão credenciada faculdade vem a público para falar tantas asneiras.Nada do que ele fala, que não seja defender as elites dos Estados dominadores, faz qualquer sentido, nem tem qualquer relação com a realidade brasileira. Chavões repetidos sem reflexão e desconhecimento da história e da economia da Região norte e do Brasil.Um desastre total. Não sei porque essas figuras sem qualquer importância nos meios intelectuais são sempre chamados para distilar os seus raciocínios primários e seus racismos preconceituoso sobre assuntos que não conhecem.Podiam indicar, pelo menos, um sujeito do sudeste que arranhasse de leve um assunto tão complexo.

Yúdice Andrade disse...

Quer dizer que nós somos uma região "super-representada" no Congresso Nacional, é? Pôxa, deve ser por isso que nós, nortistas, conseguimos tudo o que queremos em termos de investimentos, desenvolvimento, políticas públicas, representatividade nos poderes Executivo e Judiciário em Brasília, etc.
Triste, essa.

Val-André Mutran  disse...

Somos super representados! Uma pérola, caro doutor Yúdice.

Val-André Mutran  disse...

Total desconhecimento da matéria.
Um desastre, caro Dr. Roberto.

Anônimo disse...

Val, divulque isso.
Boa Sorte.

QUARTA-FEIRA, 15 DE JUNHO DE 2011

Redivisão do Pará: População diretamente interessada
Carlos Emídio
Auditor Fiscal do Município de Santarém

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 18, parágrafo 3.º, determina que: “Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população diretamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar.”

A Lei 9.709/98, que regulamenta a execução do disposto nos incisos I, II e III do art. 14 da Constituição Federal, no artigo 7.º, determina que:
“Nas consultas plebiscitárias previstas nos arts. 4o e 5o entende-se por população diretamente interessada tanto a do território que se pretende desmembrar, quanto a do que sofrerá desmembramento; em caso de fusão ou anexação, tanto a população da área que se quer anexar quanto a da que receberá o acréscimo; e a vontade popular se aferirá pelo percentual que se manifestar em relação ao total da população consultada.”

A primeira parte do referido artigo da lei citada obstruiu o desmembramento de Estados e Territórios, uma vez que, ao definir o que se entende por população diretamente interessada, inviabiliza o plebiscito, pois contraria as três etapas previstas no parágrafo retro:
Primeira Etapa: Consulta via plebiscito da população diretamente interessada;
Segunda Etapa: Consulta via oitiva da Assembléia Legislativa;
Terceira Etapa: Lei Complementar do Congresso Nacional, aprovando o desmembramento.

O artigo 7.º indica que o legislador ordinário, ao dizer o que se deve entender por população diretamente interessada diante do desmembramento, quis dirimir uma suposta controvérsia acerca do significado e alcance da consulta plebiscitária, inclusive, contrariando as jurisprudências do STF e do TSE, as quais já interpretaram o questionado termo em diversas oportunidades.

Na subdivisão e na incorporação, a consulta plebiscitária é feita com TODA a população de cada um dos Estados que pretendem subdividir-se ou incorporar-se. Já o desmembramento é totalmente diferente: apenas uma (ou mais) parte do Estado requer a redivisão do território, de modo que o restante não quer a separação. A população da parte a ser desmembrada é a diretamente interessada, pois é ela que pleiteia poderes derivados-decorrentes da Constituição Federal para constituir uma nova entidade federativa.

No dizer de José Afonso da Silva, renomado constitucionalista pátrio: “Desmembramento de Estado, portanto, quer dizer separação de parte dele, sem que ele deixe de ser o mesmo Estado. Continua com sua personalidade primitiva, apenas desfalcado do pedaço de seu território e população separados. A parte desmembrada poderá constituir novo Estado, ou anexar-se a outro, ou formar Território Federal. População diretamente interessada, no caso, é a da parte desmembrada, é a da parte que quer separar-se.< Portanto, como os Estados, por princípio, não têm interesse em se desfazer de parte do território, consequentemente, também, não têm interesse em chamar a população para decidir em plebiscito proposta de cisão do território.

Diante das exposições, não tem qualquer fundamento a alegação dos defensores “antitapajônicos” e “anticarajaenses” de que população diretamente interessada é a totalidade do território a ser desmembrado. Não cabe, ainda, estender a interpretação da jurisprudência do STF, relativa aos municípios, para os Estados.

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