Entrevista: A violência e seu reflexo nas eleição de 2018 no Pará


Delegado com formação acadêmica e considerado linha de frente. Remanescente “era de ouro” da crônica policial paraense. Delegado João Moraes é apresentado sem censura nessa entrevista ao jornalista Val-André Mutran, em Brasília.

Redator: Val-André Mutran

Entrevistado: Delegado João Moraes
  • Repórter –– Conte-nos um pouco de sua história, origem e o que lhe motivou, sendo um Bacharel em Direito, seguir carreira na área policial? Foi vocação ou há precedentes na família? 
  • Delegado João Moraes – Meu nome é João Nazareno Nascimento Moraes, também conhecido como Delegado Moraes. Sou um Humanista, criado em família tradicional, cuja maior herança foi a cultura adquirida de respeito à base familiar e de amor a pátria.
    Meus pais foram contra, no início, com a minha decisão inicial de deixar a minha estável carreira como advogado, rapidamente estabilizada no mercado, e fazer a ruptura para me preparar para ser um Delegado de Polícia.
    Doutorando, Mestre em Direito nas Relações Sociais pela Universidade da Amazônia - UNAMA. Tenho Pós-Graduação com especialização em Polícia Judiciária pela Universidade do Estado do Pará - UEPA, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Estácio de Sá/RJ. Possuo Graduação em Direito pela Universidade da Amazônia - UNAMA (1991) com especialização em Direito Previdenciário e Direito Penal. Fui estudante do Curso de Economia da Unama. Sou servidor público estadual Delegado de Polícia aposentado, ex-Secretário Interino de Segurança Pública do Estado do Pará, ex-Delegado Geral da Polícia Civil do Estado do Pará. Sou professor da ACADEPOL/PA, do IESP, ex-Professor convidado da Escola de Sargentos das Armas (ESA), ex-professor da Faculdade de Pará de Minas (FAPAM), professor convidado da empresa de segurança Puma. Autor dos Livros:
    Polícia Cidadã, Invalidez: Acesso ao mercado de trabalho para Policiais Cadeirantes; Alternativas à prisão e Aposentadoria por Opção. Também sou autor de vários artigos publicados pelos jornais O Liberal, Diário do Pará e Correio do Tocantins. Assim como, um dos compositores do hino da Polícia Civil do Pará.
    Tive a honra de ser Presidente de vários centros comunitários que fundei. Sou ex-presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado do Pará e atual Presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado do Pará (ADEPOL/PA). Ministro palestras nas áreas de minhas especializações e na área dos Direitos Humanos. Advogado com carteira recolhida a pedido, ex-membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/PA. Professor convidado de banca examinadora de TCC da UNAMA. Canto na noite profissionalmente, sou também compositor e Poeta nas horas vagas.
  • Repórter –– Com 142 anos de existência da Polícia Civil no Pará, o senhor é um dos remanescentes de uma era de policiais civis que fizeram história, no interior e na Capital. O que mudou na Polícia?
  • Delegado João Moraes – A Polícia historicamente sempre foi o patinho feio dos poderosos. Hoje, enfrenta luta desigual contra os usurpadores de suas prerrogativas, ou seja, mesmo com as garantias constitucionais é desrespeitada por quem deveria lhe fortalecer, entretanto, está resistindo aos ataques de usurpação com argumentos constitucionais contundentes de suas garantias.
  • Repórter –– Mesmo sem os avanços tecnológicos hoje disponível para o aparato policial, especialmente à disposição da polícia judiciária. Na sua avaliação, quais seriam os fundamentos que sempre existiram na atividade policial e que hoje parecem não serem suficientes no combate ao crime?
  • Delegado João Moraes – A linha empírica hoje, por incrível que possa parecer, faz muita falta para os ideais das investigações tecnológicas, que abraçadas de forma voraz, muitas vezes, possivelmente ultrapassam os limites constitucional. Por isso, tenho tanta saudade das ações empíricas de sufocamento do crime e do criminoso no limite da lei passo a passo, na dedicação de cada policial da antiga.  
  • Repórter –– Como o senhor avalia a grade curricular da formação de um Delegado de Polícia Civil, Investigador, Escrivão e a da Polícia Científica?
  • Delegado João Moraes – A grade curricular para Delegado de polícia é equivocada dada a exigência de sua formação, se exigir, o que é incompreensível, ou seja, que se tenha que repetir as mesmas disciplinas do curso de Bacharelado em Direito na Academia de Polícia, que deveria dedicar-se, as delegacias modelos em práticas processuais e investigativas das atividades de um delegado de polícia. Equívoco que também prevalece para a formação dos seus agentes. 
  • Repórter –– O senhor esteve diante de inúmeras dificuldades operacionais quando serviu em municípios do interior do Pará, muitos deles, que apresentavam os maiores índices de violência e criminalidade do Estado, como por exemplo Marabá.
    Diante desse quadro adverso, quais foram as suas prioridades para alcançar e superar as metas de trabalho que o senhor executou?
  • Delegado João Moraes – Hierarquia e disciplina, dedicação 24 horas, apoio constante à prevenção, investigação de tudo e de todos, atendimento educado e eficaz, participação direta nas diligências, controle no administrativo, relacionamento social digno, fortalecimento da equipe com amparo pessoal, e prisões técnicas, assim como revide na forma da lei. 
  • Repórter –– O senhor é considerado por muitos, o melhor Delegado-Geral que o Pará contou nos últimos 30 anos. O que houve, afinal, para todos esses índices virassem o jogo em favor da bandidagem?
  • Delegado João Moraes – A quebra significativa da hierarquia e da disciplina pelos comandos esfacelados pelas indicações políticas. Outro ponto é o avanço ilegal de usurpadores da atividade policial civil. Assim como, a utilização muitas vezes indevida da fiscalização e da repressão interna. Outro motivo do avanço é a quebra no padrão de sobrevivência pessoal de cada policial e a aniquilação das instituições superiores de Estado, diga-se de passagem, os três poderes, que por essa também enfraqueceu em demasias as unidades federativas de segurança pública. 
  • Repórter –– Conte-nos a sua vivência no meio político. Quais as motivações que o levaram a ser um dos idealizadores da Federação Nacional dos Delegados de Polícia. Sua atuação à frente do órgão, assim como, a frente da ADEPOL?
  • Delegado João Moraes – Tudo aquilo que não consegui realizar a frente da Chefia de Polícia ou como Secretaria de Segurança do meu Estado interinamente, no que diz respeito a melhores condições de remuneração para minha categoria e a de nossos agentes, foi o que levou-me a procurar o mundo sindical para corrigir as impossibilidades a mim impostas pelo governo de minha época como Chefe de Polícia. Quanto a Federação, a idéia foi de um colega de São Paulo, Delegado Melão, também à época Presidente do Sindicato dos Delegados de São Paulo, idéia esta que abracei de pronto dada a fragilidade da categoria em todo território nacional. E é graças a Federação, hoje dirigida pelo Dr. Rodolfo Laterza (indicação nossa), e graças a ADEPOL Brasil, dirigida pelo brilhante colega Dudu, Delegado de São Paulo, que ainda sobrevivemos diante das investidas vorazes de parte do Ministério Público, que almeja a extinção da categoria Delegado de Polícia, mesmo não tendo esta, caixa preta lacrada por sete chaves, como outros detêm.
  • Repórter –– Chegamos agora ao nosso tema principal. Como o senhor avalia o impacto da Segurança Públicas nas Eleições 2018 no Pará?
  • Delegado João Moraes – Nos mesmos patamares de outras ocorridas, já que o povo brasileiro adormece em período eleitoral e só reencontra o equilíbrio de sua consciência política partidária com a constatação das mesmas atitudes por parte dos eleitos.
  • Repórter –– O quê precisa ser feito para a consolidação de uma efetiva política de segurança pública no Pará, para o viés dessa guerra ser vencida pelos mocinhos?
  • Delegado João Moraes – Reequilibrar o poder nos patamares idealizados pelo próprio sistema em que, legislativo seja verdadeiramente legislativo, judiciário seja verdadeiramente judiciário, executivo seja verdadeiramente executivo, e que os outros órgãos não desejem seus lugares. Ou seja, que juiz não queira ser legislador, que legislador não queira ser juiz, que executivo não queira ser o dono dos outros dois, que promotores não queiram as prerrogativas de outros, que delegados não queiram ser juízes, que nossos agentes não queiram ultrapassar o limite das suas competências e que o povo em sua maior parte crie a capacidade de entender a importância do voto. 
  • Repórter –– Existem Milícias, Esquadrões da Morte, Sindicatos de Pistoleiros no Pará, delegado?  
  • Delegado João Moraes – As ações policiais da Policia Civil do nosso Estado em investigações já aprofundadas, algumas certamente já detectaram, e em alguns casos, até já finalizaram os inquéritos. Então, considero como afirmativa, porém, as instituições estão atentas e esperando ordem que lhes garantam a certeza de agir com o rigor da Lei, pois todo policial sabe que nos possíveis excessos que possam acontecer, ele responde. O que os pseudos defensores dos direitos humanos nunca observam.
  • Repórter –– Muitos críticos, notadamente ativistas dos movimentos em defesa dos direitos humanos, garantem que a polícia paraense sempre foi muito violenta e que mata demais. E polícia que mata muito, morre muito também. Como o senhor avalia esse cenário de inversão de papéis em que as supostas milícias colocam a prêmio a cabeça de policiais, fardados ou não, oferecendo vantagens e promoções nas organizações criminosas? 
  • Delegado João Moraes – Primeiramente, os papéis não estão investido, os bandidos ainda são bandidos, e polícia ainda é polícia. A necessária força de Estado é que se perdeu ao bel prazer do Poder pelo Poder, fulminando, em parte, de morte a necessária presença policial nas ruas por tudo que possa ser necessário, como concurso público anual, salários dignos e comando consolidado por seus auxiliares ou colaboradores. 
  • Repórter –– Como o senhor recebeu o plano emergencial de combate à criminalidade anunciado há 20 dias pelo governador Simão Jatene? O senhor pode comentar os pontos do plano? 
  • Delegado João Moraes - Com a mesma visão que recebi os outros, fraco, inodor e mais do mesmo, ainda que tenham brilhantes colegas no comando que, engessados muito pouco podem fazer.
  • Repórter –– Muitos policiais egressos das forças de segurança pública estão oferecendo os seus nomes para cargos nessas eleições. Qual a dimensão desse fenômeno?
  • Delegado João Moraes – De busca do poder que ofereça melhores condições de vida, diante da insatisfação nacional das categorias que envolvem o sistema de segurança pública para com suas prerrogativas abandonadas, pisoteadas e enterradas nos porões dos ditadores modernos.
  • Repórter –– O senhor acha imprescindível a participação de policiais na vida política?
  • Delegado João Moraes – Atualmente sim, entretanto, se o Estado retomar sua essência de forma que garanta os nossos direitos como constitucionalmente precificados, certamente retornaremos à base das nossas instituições, certos de que parte de nossos representantes tanto do judiciário, como no executivo e no legislativo, não mais nos tratarão como escravos modernos.
  • Repórter –– Como um Delegado ou um Coronel pode agir politicamente para garantir melhorias para as famílias dos policiais?
  • Delegado João Moraes – Elaborando normas que possam consolidar pelas suas experiências melhores dias às instituições de segurança.
  • Repórter –– O senhor concorda com a decisão do governador Simão Jatene em não aceitar ajuda federal para o combate ao crime no Pará?
  • Delegado João Moraes – Concordo, em parte, haja vista, que a Força Nacional não tem essência de Força Nacional, é apenas a somatória de vários colegas de outras instituições dos Estados-membros da Federação e que na sua grande maioria não conhece a realidade das nossas necessidades e estratégias. A Força Nacional deveria ser o segmento fardado da Polícia Federal nos Estados em apoio às polícias estaduais quando necessário. Acredito que nossos soldados do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, ao darem baixa nas suas regiões de origem deveriam automaticamente, para que muitos não sirvam de coabitação do crime e do criminoso, serem efetivados nas Polícias Militares, Civil, Guardas Municipais, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Federal. São homens e mulheres treinados abalizados para adentrarem nessas Instituições com critérios pré-estabelecidos em editais normativos e constitucionais. Esse entendimento da Carta Magna, em muito resolveria, em percentual elevado, parte dos nossos problemas.
  • Repórter –– Na sua opinião, onde o governo errou no combate ao crime e acabou resultando nesse processo de escalada desenfreada da criminalidade?
  • Delegado João Moraes – Todos os poderes contribuíram nessa briga desenfreada de poder pelo poder, em que o Legislativo quer ser mais que o Executivo, o Executivo quer ser mais que o Judiciário, e o Judiciário quer ser mais que os dois.
  • Repórter –– O senhor se sente seguro andando nas ruas de Belém?
  • Delegado João Moraes – Não, se o meu próximo não se sente, por que eu iria me sentir? Pelo menos levo uma vantagem sobre eles, por ter um olhar policial. Porém não dá pra ficar com os olhos em alerta 24 horas. 
  • Repórter –– Quais as orientações o senhor daria para o cidadão melhor se proteger dessa violência desenfreada?
  • Delegado João Moraes – Orar para Deus, pensar em quem votou, pesquisar sobre meios de proteção, perder o medo de ter medo, evitar lugares de eventos sem a presença das autoridades policiais rondantes, evitar lugares ermos, evitar andar sozinho, denunciar no anonimato oferecido pelas autoridades, etc. 
  • Repórter –– Suas consideração finais.
  • Delegado João Moraes – Gostaria de agradecer a oportunidade, deixar as portas abertas, orar para que meus pensamentos externados estejam certos. E esperar que um dia possa voltar à atividade policial, haja vista, que já apelei várias vezes sem êxito para tanto, e me colocar à disposição das autoridades, naquilo que de melhor sei fazer, que é defender o cidadão do meu estado.

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