Cristovam Buarque: O resto a gente faz depois

Ontem o Jornal Nacional entrevistou o candidato do PDT, Cristovam Buarque, na série de reportagens com os principais candidatos à Presidência. Você pode ler abaixo ou ver aqui.

A primeira pergunta tentou e conseguiu desqualificar o candidato, que conseguiu apenas explicar que é o pai do Bolsa Escola, mas, que em dado momento, errou politicamente na ocasião de sua reeleição, passando o bastão do GDF (Governo do Distrito Federal) para seu adversário Joaquim Roriz.

Defendeu a Educação, sua especialidade e bandeira maior de Brizola, mas, suicidou-se na entrevista quando disse que o resto é o resto (Saúde, Segurança Pública, Estradas).

Não candidato, o resto tem que ser feito junto, articuladamente, com planejamento e metas.

Foi nocauteado o new pedetista.

Eis a íntegra. O tempo é o mesmo concedido aos demais: 11,5 minutos, com prorrogação máxima de 30 segundos.

William Bonner: O senhor já teve duas oportunidades de executar, de pôr em prática as suas idéias. Como governador do Distrito Federal e como Ministro da Educação do presidente Lula. Como governador o senhor não conseguiu se reeleger, não passou na prova das urnas no fim do mandato. Como ministro, o senhor foi demitido pelo presidente Lula. Como é que o senhor se credencia à Presidência?

Cristovam Buarque: Porque nos dois cargos eu cumpri tudo o que prometi.

William Bonner: Tudo?

Cristovam Buarque: Tudo. Quando eu estava no governo, em quatro anos criei a Bolsa Escola, criei a Bolsa Escola, implantei.

William Bonner: Mas o Bolsa Escola não foi uma criação do prefeito de Campinas?

Cristovam Buarque: Não, o Bolsa Escola surgiu em 1986, quando eu era reitor, publiquei um livro dizendo isso, e no primeiro dia de meu governo eu lancei. Campinas, pouco depois e eu fui lá ajudá-los. E lá não foi Bolsa Escola. Lá foi um programa também assistencial porque era na Secretaria de Assistência. Na Secretaria de Educação, comprometido com a educação e dentro da bolsa investindo na educação, só eu que fiz. Agora, não foi só isso. Ampliamos a jornada, aumentamos 64% do salário do professor, criamos o Poupança Escola. Toda criança da Bolsa Escola recebia, no final do ano, se passasse de ano, o dinheiro na caderneta de poupança.

William Bonner: Certo candidato. Então o senhor se candidatou à reeleição.

Cristovam Buarque: E perdi.

William Bonner: E perdeu. Por que? O senhor não encara isso como uma demonstração de que o senhor foi reprovado pelos seus eleitores?

Cristovam Buarque: Não, porque até o último momento as pesquisas me davam como vitorioso. E eu não menti.

William Bonner: Mas na hora da contagem...

Cristovam Buarque: Não, muito simples, eu errei do ponto de visto político, acertei do ponto de vista moral. Me neguei a dizer que daria um aumento de 28% aos funcionários. O meu opositor disse que daria e não deu. Isso levou 15 mil pessoas, pelo menos, a mudar de lado. As pesquisas me davam como vitorioso, eu saí do governo com 83% de aprovação. Então, não considero que foi um fracasso. Tanto que, quatro anos depois, eu fui eleito com a maior votação que o Distrito Federal já deu a um político que foi como senador. Quanto ao Senado e quanto ao Ministério, quando eu cheguei lá eu peguei o programa de governo do Lula e disse: ‘Isso é para valer’. E comecei a executar. Criei o programa de certificação federal do professor, que é o passo do que eu chamo de federalização, criei o programa de erradicação do analfabetismo em quatro anos, que o presidente em março já disse que eu queria comer cru, que quem come apressado come cru. Criei o programa de escola ideal...

William Bonner: Mas o senhor foi demitido pelo presidente...

Cristovam Buarque: Sim, claro, porque incomodei demais o presidente.

Fátima Bernardes: Por que então o senhor não pediu demissão?

Cristovam Buarque: Porque eu ia brigar para fazer. Eu queria ficar na história desse país como o ministro que erradicou o analfabetismo. Esse era o sonho, sabe porque? Porque o resto leva 15 anos para fazer. O ministro anterior ficou oito anos, eu fiquei 12 meses. Agora, eu comecei tudo. Tudo o que precisava eu queria, eu comecei. Comecei com o MEC e aquilo que não dava para fazer no MEC, que precisava de lei, eu dei entrada na Casa Civil. Lá na Casa Civil, nas gavetas da Casa Civil tá o projeto de escolas quatro anos, o projeto de um ano a mais no Ensino Médio, com a formação.

William Bonner: Projetos né, candidato?

Cristovam Buarque: Não, claro, mas é o presidente que manda para o Congresso. Mas o ministro não pode mandar projeto para o Congresso. E o que é que o presidente mandou dizer para mim? Que isso ia atrapalhar a reeleição dele porque ia chegar ao prefeito que não ia gostar. Então eles pararam. Eu incomodei tanto que eu saí e sinceramente não me arrependo.

Fátima Bernardes: Mas o senhor não teve uma dificuldade com o que é executável? Quer dizer, muitos criticam que o senhor é um homem de idéias mas que falta uma habilidade executiva...

Cristovam Buarque: Não, não, ao contrário. Do ponto de vista executivo eu fiz tudo. Faltou habilidade política. E eu não queria ter habilidade política dentro de um governo que não dava prioridade à Educação.

Fátima Bernardes: E essa habilidade política não vai ser necessária ao senhor como presidente?

Cristovam Buarque: Como presidente, como presidente eu não vou nomear, eu vou nomear o ministro. Eu não vou ser demitido pelo presidente. É claro que eu fiz tudo o que era preciso. Agora, não tive habilidade para entrar naquele meio que é o PT. Sempre que fui um PT eu ia de fora. Não tive e felizmente não tive. Imagine que eu tivesse tido e estivesse lá ainda hoje.

William Bonner: Agora, candidato, a sua principal bandeira nessa campanha, a sua marca registrada é educação. O senhor fala em resolver o problema do analfabetismo, tirar do analfabetismo de 15 a 20 milhões de brasileiros. Agora, durante essa sua permanência no Ministério da Educação, o analfabetismo no Brasil não caiu.

Cristovam Buarque: Caiu.

William Bonner: Não caiu, segundo o IBGE, não.

Cristovam Buarque: Um momento, 3 milhões era a meta. Eu coloquei 3,2 milhões em sala de aula. A meta era 3 milhões.

William Bonner: Candidato, o senhor me permite, eu tenho números aqui do IBGE, colhidos. Em 2003, no início do mandato do presidente Lula e da sua gestão no Ministério, eram 14,635.519 milhões analfabetos no Brasil. São pessoas com mais de 15 anos de idade. Em 2004, no ano seguinte, eram 14,650.997 milhões. São mais de 15 mil brasileiros a mais...

Cristovam Buarque: Primeiro, eu queria dizer o seguinte, esses termos absolutos, é que a população cresce e no Brasil é uma torneirinha aberta.

William Bonner: Certo, mas não caiu né?

Cristovam Buarque: Não, caiu porque estava na escola. Eu botei 3, 2 milhões estudando para sair do analfabetismo. Outros entraram. Saem e entram todos os dias porque a erradicação do analfabetismo, para valer, só quando fizer aquilo que eu defendo, gente, uma revolução na educação de base. Tem uma torneirinha aberta. Todos os dias saem jovens, virando adultos analfabetos. Você tem que erradicar o analfabetismo, 15 milhões, a meta era 3 milhões eu botei 3,2 milhões e além disso fechar a torneirinha. Como é que fecha a torneirinha? Comecei a escola ideal, seis horas de aula por dia. Começamos em 29 cidades. Levaria dois anos com essas 29 cidades. Em 15 anos, 5,561 mil cidades teriam horário integral.

Fátima Bernardes: No seu projeto, o senhor defende a federalização do ensino, não é, no Ensino Médio? Brasília passaria a controlar as escolas Brasil afora?

Cristovam Buarque: Não, não, não. Mantém-se a descentralização gerencial. O prefeito é gerente. Eu até defendo que, em alguns casos, o pai e os professores sejam os donos da escola, gerencie. Agora, definem-se três padrões mínimos para todas as escolas do Brasil. O padrão de salário e de formação. O padrão de conteúdo e o padrão de edificações e equipamentos.

Fátima Bernardes: Mas isso é federalização?

Cristovam Buarque: Eu chamo federalização, pode-se inventar outro nome. Você já reparou que uma agência do Banco do Brasil é igualzinha em qualquer lugar que você for? O funcionário do Banco do Brasil ganha o mesmo salário, não importa a cidade rica ou pobre onde ele trabalha. Ele passou num concurso federal. Vocês já repararam isso? O computador dele é bom. Por que a gente sai da agência do Banco do Brasil, entra numa escola e ela é completamente diferente?

Fátima Bernardes: Mas não tem as peculiaridades regionais que precisam ser respeitadas?

Cristovam Buarque: Claro que tem que ter. Até o Banco do Brasil tem. O conteúdo mínimo. Toda criança tem que aprender a ler antes dos sete, oito anos de idade, em qualquer cidade do Brasil. Hoje é impossível, sabe porque? Porque a desigualdade de uma cidade para outra é muito grande e a vontade de um prefeito para o outro é muito grande. Você tem que ter uma lei de responsabilidade educacional. O prefeito que não cumprir metas federais fica inelegível. Não existe uma lei federal de responsabilidade fiscal? Porque não tem uma lei federal de responsabilidade educacional de tal maneira que um programa que vá durar 15 anos, vai levar 15 anos, não faço demagogia, 15 anos. Se leva 15 anos, é preciso que de um prefeito para o outro continue. E isso a gente não tem hoje. Por que? Porque o governo federalizou os aeroportos. Já pensou se cada cidade fizesse o aeroporto como quer? A Caixa Econômica é federal, o aeroporto é federal, banco é federal. Por que criança não é tratada com o carinho de um presidente da República? Por que? É preciso fazer com que educação básica seja uma responsabilidade do presidente. Aí definem-se metas para o país inteiro. Padrões para o país inteiro. Toleram-se as diferenças de cada um.

Fátima Bernardes: Um projeto seu como senador foi aprovado agora, que é do aumento do salário-mínimo federal de R$ 800. De onde viria esse dinheiro e quanto isso representaria de aumento de gastos?

Cristovam Buarque: Para fazer isso, vai custar R$ 1,5 bilhão. Isso é aos poucos, isso não é de repente. O Brasil gasta R$ 5 bilhões em repetência.

William Bonner: Mas não há previsão orçamentária para isso...

Cristovam Buarque: Não tem é para esse orçamento. Eu quero ganhar para colocar no próximo. R$ 700 bilhões. Não gasta 1%. Vocês têm três filhos. Se colaborassem 1% a mais para melhorar a escola, vocês não gastariam?

William Bonner: Evidentemente que sim. O problema, candidato, é que a partir do momento em que o senhor estabelece que o poder público, poder Executivo vai bancar um projeto, não é natural que a população lhe pergunte: ‘Mas de onde vai sair este dinheiro’?

Cristovam Buarque: Mas vocês não perguntaram de onde, vocês perguntaram se existia...

Fátima Bernardes: De onde, qual é o peso disso?

Cristovam Buarque: De diversos lugares. Por exemplo, hoje se faz uma renúncia fiscal de R$ 35 bilhões, porque a gente não pode ter a R$ 7 bilhões para educação? R$ 7 bilhões. Hoje as estatais têm um lucro de quase R$ 30 bilhões. O governo federal acabou de gastar R$ 9 bilhões para cobrir um rombo do fundo de pensões de uma estatal. R$ 9 bilhões. Eu falo em R$ 7 bilhões. Não só para o salário. Para o salário, para construir escola, para botar horário integral, para tudo isso. R$ 7 bilhões é 1% do orçamento.

William Bonner: O senhor não acha que isso pode frustrar os eleitores? Eu fico imaginando a situação daquele professor que imagina assim: ‘Opa, um salário-mínimo de R$ 800, o governo vai me dar’. Mas, se não há previsão orçamentária, não se sabe ainda de onde vai sair esse dinheiro...

Cristovam Buarque: Olha, eu achava que o Lula ia fazer uma coisa que seria revolucionária. Transformar necessidade em demanda. Quando você cria essa lei, cria essa demanda. As pessoas vão pedir, o dinheiro vai aparecer. Agora, quando você não cria uma lei como essa, você não demanda, você necessita. E necessitado fica de fora. Por exemplo, quem tem dinheiro no bolso entra no supermercado e demanda. Quem não tem dinheiro no bolso fica na calçada e necessita. A gente tem que trazer quem ta fora para dentro. Professor tem que virar gente nesse país porque a pergunta mais séria é porque é que não teve ainda um salário-mínimo para professor, gente? Tem para toda profissão. Por que? Porque deixou-se que é um critério municipal. Vamos definir um salário para professor, a nível federal. Professor merece. Outra coisa. O futuro do Brasil tá no professor. A gente quando faz um viaduto, uma estrada, leva de um lugar para o outro. Mas do presente ao futuro, só a escola, só o professor.

Fátima Bernardes: O senhor está falando de um assunto que é quase que unanimidade, as pessoas realmente pensam em educação.

Cristovam Buarque: Sabe que não é unanimidade. Se não eu não estava com 1% nas pesquisas...

Fátima Bernardes: Exatamente o que eu ia perguntar. Por que o senhor atribui, onde o senhor estaria errando para que a sua pesquisa não saísse desse patamar de 1%?

Cristovam Buarque: Porque, por incrível que pareça, é uma novidade?

Fátima Bernardes: O que é uma novidade? A sua candidatura?

Cristovam Buarque: Ter um presidente que diga que educação é prioridade.

William Bonner: É a isso que o senhor atribui?

Cristovam Buarque: Não, nenhum disse. Acabou de ver aqui, o Alckmin. Ele tá falando gestão, foi uma crise de gestão, economia. Nenhum fala educação. Eu estou aqui porque eu quero mudar o meu país. E só tem um jeito de mudar. É uma revolução na educação.

William Bonner: Eu gostaria de saber então, esta é sua prioridade, educação. Qual é a sua segunda prioridade?

Cristovam Buarque: Todas as outras. Mas são obrigações. Tem que cuidar da economia, da saúde, da escola, da estrada. Agora, mudar, fazer um Brasil novo. O Brasil bate numa parede. A gente cresce mas não distribui. A gente faz estrada, mas tem que fazer cadeia. Vocês viram o noticiário até a pouco. O noticiário só tem corrupção, só tem desperdício, perda. Sua educação é que vai revolucionar o Brasil.

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