Minha contribuição para o debate
por João Luiz Mauad em 16 de outubro de 2006
Resumo: Algumas perguntas que não foram feitas, mas deveriam, ao presidente Lula.
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Em tempos de debates, sabatinas e entrevistas coletivas, quem não gostaria de fazer algumas perguntas aos candidatos? Aqui vão algumas delas, que eu gostaria de fazer ao presidente Lula
2. Voltemos um pouco no tempo. Estamos no início do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. O senhor é um líder oposicionista implacável, cuja atuação está centrada na ferrenha defesa da ética na política e no trato da coisa pública. Imagine que um dos filhos do presidente FHC seja um jovem biólogo esforçado, cujo destino não tivesse feito dele, até então, mais do que um reles barnabé, empregado de um jardim zoológico qualquer. Suponha agora que, dois anos após a posse do pai na presidência, o senhor ficasse sabendo que o jovem herdeiro do professor Cardoso, sem qualquer experiência profissional anterior no ramo, tornara-se um próspero (e põe próspero nisso!) empresário do ramo de informática, sócio de uma empresa de desenvolvimento de software, com capital aproximado de US$ 10 milhões. Imagine ainda que o senhor viesse a descobrir que aquele novo e suntuoso empreendimento tinha como sócio capitalista nada menos do que a maior concessionária de serviços de telecomunicações do país, a qual, por sua vez, contava em seu rol de acionistas com alguns fundos de pensão de empresas estatais, além do próprio Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Enquanto líder da oposição, como é que o senhor reagiria a uma situação dessas? Não seria o caso de pedir o impeachment do presidente?
3. Vamos falar de um tema delicado: aborto. Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei (PL 1135/91), DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO, para a total descriminalização do aborto no Brasil. O PL foi entregue ao Deputado Benedito Dias, presidente da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, no dia 27 de setembro de 2005, pela Ministra Nilcéia Freire, logo após reunir-se com o senhor para, conforme o jornal O Estado de São Paulo, obter o seu aval para tal iniciativa. O projeto foi entregue à relatoria da deputada federal Jandira Feghali, do PC do B do Rio de Janeiro que, a partir daí, veio a tornar-se a principal aliada do governo e impulsionadora do projeto no legislativo. Os dois primeiros artigos do PL não deixam quaisquer dúvidas sobre as reais intenções do mesmo, qual seja: a completa liberação do aborto no Brasil. Para que não pairem dúvidas sobre a sua correta interpretação, vamos a eles:
"Art. 1º Toda mulher tem o direito à interrupção voluntária de sua gravidez, realizada por médico e condicionada ao consentimento livre e esclarecido da gestante.
Art. 2º Fica assegurada a interrupção voluntária da gravidez até doze semanas de gestação".
O PL, como se pode atestar, não se refere a casos excepcionais de má formação fetal ou de risco para a gestante, mas concede à mulher grávida o direito de decidir, sozinha, sobre a conveniência ou não de interromper a gestação. Diante disso, presidente, podemos concluir que o senhor é favorável à completa liberação do aborto no território nacional?
4. Eu sei perfeitamente que o senhor não é "delegado de porta de cadeia" e, por isso, não vou perguntar-lhe de onde veio aquela montanha de dinheiro que os seus intimíssimos "meninos aloprados" usariam para comprar o dossiê contra os tucanos. Entretanto, eu gostaria de contar com a sua capacidade de discernimento para analisar um aspecto que me intriga nessa questão. Como bem disse o sr. Berzoini, o fato de se negociar um dossiê não é crime, ou pelo menos não existe nada na lei brasileira que impeça uma transação desse tipo. Um crime (eleitoral, vá lá!) só ficaria configurado, caso se pudesse comprovar a origem ilícita do dinheiro, o que a Polícia Federal ainda não conseguiu determinar, mesmo que esteja empenhadíssima na resolução do problema, conforme tem afirmado reiteradamente o Ministro Thomas Bastos. No entanto, o senhor não acha muito estranho que não tenha aparecido, até este momento, ninguém para requerer a titularidade daquela montanha de reais e dólares? Se a grana não é ilegal, porque não tem dono? Não é estranho, presidente? Se o senhor fosse oposição, o que estaria achando disso tudo?
5. Para finalizar, uma pergunta sobre um tema que lhe é muito caro e sobre o qual o senhor sente-se à vontade para discutir com quem quer que seja, neste país: ética. Preliminarmente, para que possamos estar seguros de que falamos da mesma coisa, eu gostaria de definir este termo tão complexo e, para tanto, contarei com a ajuda do professor Antônio Houaiss: ética é a "parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano, refletindo especialmente a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social". Segundo o mesmo professor Houaiss, "honra" é o "princípio ético que leva alguém a ter uma conduta proba, virtuosa, corajosa, e que lhe permite gozar de bom conceito junto à sociedade”. Já "vergonha", de acordo com o mestre, é "o sentimento de [grande] desonra ou humilhação" causado pelo julgamento público. A minha pergunta, portanto, é a seguinte: tendo sido, em última instância, o responsável pela nomeação de todos aqueles ministros de estado - Palocci, Dirceu, Berzoini e outros - que hoje estão denunciados pelo Ministério Público por crimes diversos na incumbência do cargo que ocupavam, o senhor não se sente nem um pouco envergonhado perante a sociedade brasileira? Mesmo que o senhor não soubesse de nada do que ocorria ao seu redor, o fato de ter nomeado esses ministros não lhe causa qualquer constrangimento? Não estaria na hora de pedir novas desculpas ao povo brasileiro por tantos disparates?
O autor é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.
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