Tudo como antes...Será?

Supremo dá vitória aos nanicos

Ugo Braga
Correio Braziliense

Por 10 votos a zero, ministros do STF derrubam a cláusula de barreira, aprovada pelo Congresso em 1995. Regra ameaçava partidos que não tiveram bom desempenho nas eleições de outubro
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ontem inconstitucional os trechos da Lei 9.096/05 que criavam dificuldades de sobrevivência para os pequenos partidos — a chamada cláusula de barreira. Com a decisão, as regras tornam-se nulas. As siglas ameaçadas estão oficialmente com o pescoço fora da guilhotina. A decisão, unânime (10x0), beneficiou tanto instituições históricas e ideológicas, como PCdoB, PV e PSol, como outras menos tradicionais, como PSDC e PSL. Umas e outras não tiveram votos suficientes na eleição de outubro.
Livres da cláusula, os partidos pequenos continuarão tendo direito a dividir com os grandes o bolo do fundo partidário, a levarem ao ar todo semestre um programa gratuito com 10 minutos de duração e a aproveitarem outros 20 minutos divididos em inserções entre meio e um minuto nas redes nacional e local. E, para aqueles que elegeram representantes, também mantêm o direito de participar das comissões temáticas do Congresso e a terem lideranças para falar em seu nome, com acesso privilegiado à tribuna.
Embora se refira diretamente a pequenos partidos, a decisão do STF repercutiu imediatamente na grande articulação do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O atual presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), pretende continuar no cargo a partir de fevereiro do próximo ano e tem o apoio explícito do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas como seu partido não obtivera o desempenho mínimo, estaria impedido de se candidatar. Esse argumento vinha sendo usado contra ele pelos petistas que defendem a candidatura do atual líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP).
Ao receber a notícia vinda do plenário do STF, no fim da tarde, Aldo abriu um discreto sorriso de satisfação. E tratou de ir falar com a imprensa. “Liberdade partidária é como liberdade religiosa e liberdade de imprensa, quanto mais ampla, melhor”, disse. Depois, comemorou a decisão junto com a tropa que havia enviado para o outro lado da Praça dos Três Poderes, para acompanhar o julgamento in loco, os deputados Renildo Calheiros (PCdoB-PE), Jamil Murad (PCdoB-SP), Perpétua Almeida (PCdoB-AC), Agnelo Queiroz (PCdoB-DF) e Inácio Arruda (PCdoB-CE).
Trampolim Presidente nacional do PSDB, o senador Tasso Jereissati (CE) também veio a público, mas para criticar a decisão do Supremo. Ele se disse perplexo e afirmou “que o país dá um passo atrás nos esforços de moralização da política e do Congresso”. Aprovada há 11 anos, a lei que estabeleceu as cláusulas de barreira tinha o objetivo de retirar da política nacional partidos que só serviam de trampolim para aventureiros ou aqueles que não tinham representatividade eleitoral.
Os ministros, no entanto, enxergaram uma série de afrontas à Constituição. O relator, ministro Marco Aurélio Mello, evocou o princípio da igualdade de oportunidades, segundo o qual o Estado deve criar condições para que todos tenham chances iguais de se desenvolver. Num longo voto, elogiado pelos demais como um dos mais belos já proferidos, Mello afirmou que o desempenho requerido pela lei era uma “extravagância da disciplina legal.”
A partir do voto do relator, os ministros passaram a desfiar um rosário de críticas pesadas às cláusulas de barreira, para deleite dos muitos representantes dos partidos atingidos, como a senadora Heloísa Helena (PSol-AL). “É a ditadura da maioria”, concordou Enrique Lewandowiski. “É uma norma de exceção, é como um jardineiro que impede novas flores de desabrochar e só cuida das ervas antigas”, comparou Eros Grau. “Não é cláusula de barreira, é cláusula de caveira”, resumiu Carlos Ayres Britto.
César Peluso ainda lembrou das fusões dos partidos para fugir da cláusula, a que chamou de “fusão de heterogêneos”. “Não constrói nada para a democracia”, disse. A despeito da crítica, o deputado Roberto Freire (PE), presidente da Mobilização Democrática (fusão do PPS com o PHS e com o PMN), elogiou o STF, mas avisou que a união segue de pé.
(A cláusula) é uma norma de exceção, é como um ardineiro que impede novas flores de desabrochar e só cuida das ervas antigas
Eros Grau, ministro do Supremo
O país dá um passo atrás nos esforços de moralização da política e do Congresso
Tasso Jereissati (CE), presidente do PSDB
para saber maisRegras rigorosas
Em 1995, a cláusula de barreira foi aprovada pelos parlamentares para ter validade a partir das eleições deste ano. A regra determinava que os partidos que não conseguissem alcançar 5% dos votos nacionais perderiam recursos do fundo partidário. Pela regra, 99% dos recursos seriam distribuídos entre os grandes partidos e 1% entres as demais legendas.
Também não teriam direito a representação partidária. Os partidos nanico não poderiam indicar integrantes para as comissões temáticas, CPIs, ter direito a liderança ou cargos na Mesa Diretora. A participação nas comissões seria apenas como suplentes. O tempo de TV também diminuiria para apenas dois minutos por semestre. Os grandes partidos teriam 40 minutos por semestre.

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