Nem mel, nem cabaça

Lembram da disputa entre Pará e Maranhão para a localização de uma mega usina de produção de chapas de aço?

O Pará perdeu a rinha, mas, a Vale, pelo visto, ainda vai roer um caroço de Tucumã no Maranhão.

MARANHÃO NÃO QUER USINA DE AÇO EM SÃO LUÍS

César Felício, Vera Saavedra Durão e Francisco Góes

Valor Econômico

25/4/2007

O governo do Maranhão está disposto a vetar a construção de um pólo siderúrgico da Vale do Rio Doce, em sociedade com a chinesa Baosteel, no Estado, se a empresa não abrir negociações sobre o local onde o empreendimento será instalado. A Vale quer construir a siderúrgica na ilha de São Luís, onde conta com terminais para o desembarque do carvão e a ferrovia para a chegada do minério de ferro. O governo estadual quer a instalação do pólo na foz do rio Mearim, município de Bacabeira, a 50 quilômetros de distância.

A Baosteel e a Vale confirmaram ontem que retomaram conversações com o governo maranhense para reativar o projeto de construção da siderúrgica, o qual enfrentou diversas dificuldades nos últimos três anos, apta a produzir até 7,5 milhões de toneladas em duas etapas. O investimento total é de US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões
"Qualquer governo pode impedir a instalação de qualquer empreendimento em seu Estado, negando licenças ambientais. O terreno pretendido na ilha pertence ao governo. Mas não somos de briga. Queremos negociar para que impere o bom senso", disse o secretário da Casa Civil do governador Jackson Lago (PDT), seu primo Aderson Lago. Segundo Aderson, "na ilha os custos ambientais e sociais são grandes, em razão da poluição que o uso do carvão irá gerar, da enorme quantidade de água que irá consumir e da necessidade de deslocamento de cerca de 14 mil pessoas".

As objeções no Estado à instalação da siderúrgica em São Luís são antigas. Conflitos com outras empresas, como a Alcoa, fizeram com que se organizasse uma rede de movimentos sociais envolvendo população que vive da agricultura e pesca de subsistência em áreas de risco. O problema levou a Vale e o governo chinês a manterem contato com o governador Jackson Lago ainda antes de sua posse, em janeiro. O atual governador esteve na China, visitando as instalações da Baosteel.

Na ocasião, Lago insistiu para que o projeto da siderúrgica fosse revisto e deslocado para a foz do rio Mearim. A Vale insistiu nas vantagens logísticas de São Luís. "Não houve outros contatos desde então. Tomamos conhecimento do novo interesse da Vale pela imprensa e estamos surpresos. A Vale não nos procurou e aguardamos que ela o faça nos próximos dias", afirmou Aderson. O recado a ser dado pelo governador, segundo Aderson, será o mesmo. "Vamos mais uma vez demonstrar a inconveniência da instalação de uma siderúrgica na ilha de São Luís".
Aderson Lago afirmou que o deslocamento do projeto da usina da ilha para o continente dificilmente inviabilizaria o projeto. "Há um projeto de outro grupo empresarial para uma siderúrgica lá, o que é um sinal que há calado suficiente para fazer o desembarque de carvão. A Vale já tem um ramal ferroviário que passa por Bacabeira", disse, referindo-se ao empreendimento da Companhia Siderúrgica do Mearim. Em fevereiro, executivos deste empreendimento estiveram com Jackson Lago para apresentar o projeto da usina.
A Baosteel enviou representantes ao país para retomar negociações com o governo do Maranhão. Xi Zhiing, integrante da equipe da estatal chinesa que cuida do projeto, esteve na semana passada em São Luís, em reuniões com membros do governo para averiguar qual sua em relação ao projeto. "Agora, a execução do empreendimento está nas mãos do governo do Maranhão", disse Xi ao Valor.

A Baosteel, segundo ele, ainda aguarda uma clara definição do governo maranhense, que teria de garantir a viabilidade da posse do terreno onde seria erguida a usina e toda a infra-estrutura que cerca o investimento. Um dos pontos cruciais para o projeto sair do papel é a cessão do terreno que fica na ilha de São Luís e pertence ao Estado.

Fonte do governo maranhense disse que neste semestre será discutido o novo zoneamento urbano de São Luís, a partir do qual se definirá o tipo de uso do terreno pretendido por Baosteel e Vale. O interlocutor afirmou que a orientação do governador Jackson Lago (PDT) é ampliar o leque de alternativas em relação ao local da usina. A Vale ja refutou, em outra época, a hipótese de ser em Bacabeira.

Xi não precisou se será possível chegar a um acordo ainda este ano. "Estamos esperando por respostas. Nós viemos trabalhando no projeto, envolvendo estudos de viabilidade, mas não temos o terreno. E precisamos dele para desenvolver o projeto, do qual nunca desistimos."
Ele disse que a equipe responsável pelo projeto ainda não reavaliou a nova ordem de investimento. Terá de considerar a inflação e a apreciação do real e da moeda chinesa. Em 2005, o investimento que inicialmente estava orçado em US$ 1,5 bilhão foi revisto para US$ 2,4 bilhões com gastos adicionais com impostos. Os chineses se recusaram a pagar a conta. Hoje, nas estimativas da Vale o projeto fica entre US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões.
O executivo confirmou que o foco das negociações da Baosteel se restringe só ao Maranhão. Por enquanto não há tratativas com outro Estado como alternativa a São Luís. Xi não vê hipótese de a negociação não dar certo. "Estamos otimistas." Apesar das expectativas favoráveis, constatou em sua estadia em São Luís que nada mudou em relação à situação de dois anos atrás, quando se acentuou o impasse entre os investidores e movimentos sociais e ambientalistas contra a instalação da usina na ilha. "Não vimos muitas mudanças; por isso fomos conversar com o governo para dizer se eles são favoráveis ao nosso projeto", afirmou o executivo, que no fim de semana volta para a China.

O diretor executivo de ferrosos da Vale, José Carlos Martins, confirmou o reinício dos entendimentos e reafirmou que a Vale será minoritária no projeto. Martins, que está na China, considerou importante abrir a nova frente de negociação com o governo estadual. Ele destacou que o local preferido da Baosteel para a siderúrgica é mesmo São Luís. E lamentou que há algum tempo atrás o projeto tenha sido "enterrado" por questões relativas ao terreno e meio ambiente.

Em 2002, foi assinado o protocolo de intenções de investimento na siderúrgica. Foi o primeiro passo na execução do projeto, que tinha também a Arcelor como sócia.

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