Antes ou depois da Anistia: não importa

Não importa mesmo! Não vai dar em absolutamente nada, o pedido de prisão de um juíz italiano contra 17 brasileiros que supostamente participaram da vergonha nacional chamada Operação Condor.

No máximo a abertura de um processo, aqui mesmo, que se arrastará a passos de cágado. Outros países vizinhos, no entanto, como Argentina e Uruguaia, processou, condenou e encarcerou os meliantes, mas, como estamos na República da Banana, com um judiciário que é uma vergonha; que simboliza atos protegidos numa caixa preta; servidores que se julgam acima do bem e do mal; classe que representa da maneira a mais vergonhosa possível o espírito de corpo, gente que só quer trabalhar se for em Castelos e não em prédios públicos com funcionalidade. Ei! Acordem. Não esperem nada de animador sobre esse assunto se depender do poder judiciário brasileiro.



Documento dos EUA prova ação brasileira

SÉRGIO DÁVILA

Papel inédito obtido no Departamento de Estado norte-americano mostra participação direta do Brasil na Operação Condor

Para o americano Peter Kornbluh, especializado em assuntos da operação, país deveria abrir seus arquivos, mas está no "fim da fila"

Sim, o Brasil participou ativamente da Operação Condor. E, sim, agora, mais do que nunca, o governo precisa abrir ao público os arquivos classificados do período do regime militar (1964-1982). As frases são do maior especialista norte-americano em Operação Condor, o historiador Peter Kornbluh, do Arquivo de Segurança Nacional, em Washington. A primeira ele prova enviando à Folha um documento que a organização não-governamental ligada à Universidade George Washington conseguiu que fosse desclassificado pelo Departamento de Estado norte-americano (veja reprodução nessa página). Autor de "The Pinochet File" (O Arquivo Pinochet, New Press, 2003), Kornbluh coordena o site recém-inaugurado da instituição dedicado à operação. A segunda ele diz em entrevistas ao jornal, ontem e anteontem. Leia abaixo:

FOLHA - O fato de brasileiros estarem na lista dos mandados de prisão expedidos pela Justiça italiana comprova uma participação mais efetiva do país na Operação Condor, algo que o regime militar sempre negou?

PETER KORNBLUH - Em nosso trabalho nos arquivos nós encontramos alguns documentos que detalham a participação do país na operação, alguns inclusive do chamado Arquivo do Terror paraguaio, que acabamos de colocar no ar. Mas, é claro, a maior fonte de informações ainda está nos arquivos do governo brasileiro, nos arquivos de inteligência militar do governo brasileiro.

FOLHA - Quanto à participação efetiva do Brasil, a versão corrente é que se tratava só de apoio logístico, troca de informações. Há documento que sugere algo diferente?

KORNBLUH - Há alguns enviados por funcionários do governo norte-americano, mas o mais importante é o que conseguimos no Departamento de Estado. Datado de 20 de julho de 1976, chega ao mesmo tempo em que relatórios da CIA e do Pentágono começam a dar uma noção mais exata ao governo dos EUA sobre as atividades da operação. [Ele lê o documento, que diz que o Brasil passaria a ser um "membro integral"; veja reprodução nessa página]. Até então, os relatórios diziam que o Brasil colaborava na Operação Condor "com exceção de operações de assassinatos". Ainda assim, pode-se argumentar que uma operação de seqüestro no Brasil acabava em assassinato do mesmo jeito.

FOLHA - Seria a "pistola fumegante", na sua opinião?

KORNBLUH - Seria, sim.

FOLHA - Por que a Argentina e o Paraguai foram mais rápidos e receptivos do que o Brasil em colocar os arquivos à disposição do público?

KORNBLUH - Houve uma retomada recente no movimento pelo direito de saber no Brasil, e esse movimento está trabalhando para pressionar o governo para desclassificar os documentos e permitir de verdade o acesso do público aos arquivos. O movimento renasceu em toda a América Latina. O Brasil está atrás de países como o Paraguai, que descobriu o chamado Arquivo do Terror nos anos 90 e desde sexta-feira o expõe ao mundo pela internet, o Chile tem uma lei de liberdade de informação que ainda não resultou na reabertura de nenhum arquivo significativo. Mas o Brasil deveria ser o líder nesse processo e até agora está no fim da fila. Suspeito que é uma questão que o governo de Lula não vê como importante para não criar uma crise ou um conflito ou um problema com os militares brasileiros. Em outros países, os militares têm sido desacreditados durante o processo. O único que lida com isso diferentemente é o Brasil, que insiste em salvaguardar os arquivos. É um direito dizer que esse é um governo civil, os arquivos do passado pertencem ao povo brasileiro.

FOLHA - Na lista de nacionalidades dos mandados de prisão não há nenhum norte-americano. Como?

KORNBLUH - Os EUA, especialmente no meio dos anos 70, certamente tinham laços com os governos da Operação Condor. Abro o meu livro com uma frase tirada do primeiro resumo secreto feito a Henry Kissinger sobre a Operação Condor, em agosto de 1976, por seu secretário assistente, Harry Shlaudeman. "Internacionalmente, os generais latinos parecem "gente nossa" ["our guys", no original em inglês]. Somos particularmente identificados com o Chile. Isso não nos vai fazer bem." Então, os EUA sabiam que tinham ligações com esses países. Mas, por toda a pesquisa que fizemos, nunca houve indicação de que funcionários do governo norte-americano estivessem diretamente envolvidos nessas atividades de seqüestros e assassinatos.

Com uma exceção. Foi a de um agente FBI, num caso muito conhecido no Chile, de Jorge Isaac Fuentes de Alarcon, que foi preso e interrogado no Paraguai por agentes da polícia secreta argentina, paraguaia e chilena e então desapareceu depois de entregue ao Chile. Aqui, um agente do FBI teve conhecimento do interrogatório e forneceu ao Chile informações sobre Alarcon.

Há ainda a questão de Kissinger, cujo papel foi questionado por juízes, inclusive no Brasil. Há alguns anos, iria receber uma medalha do governo brasileiro. A informação vazou, começou a se articular um protesto e houve indicação de que um juiz brasileiro poderia interrogá-lo. Ele cancelou a viagem.

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Militante gaúcho divulga lista com supostos réus

Carlos Marchi

Jair Krischke, militante dos direitos humanos no Rio Grande do Sul, divulgou o nome dos 13 brasileiros que, na versão dele, estão na lista dos que tiveram a prisão decretada pela Justiça italiana. Em 1999, Krischke esteve no consulado italiano em Buenos Aires depondo para autoridades italianas.

A lista, segundo Krischke, é a seguinte: generais João Batista Figueiredo (à época, presidente da República), Walter Pires (ministro do Exército), Octávio Aguiar de Medeiros (chefe do SNI), Euclydes Figueiredo Filho (comandante do 1º Exército), Edmundo Adolfo Murgel (secretário de Segurança do Rio), Antônio Bandeira (comandante do 3º Exército) e Henrique Domingues (chefe do Estado-Maior do 3º Exército); coronéis Agnello Brito (superintendente da Polícia Federal no Rio), Carlos Alberto Ponzi (chefe do SNI em Porto Alegre), Luís Macksen Rodrigues (superintendente da PF no RS), João Oswaldo Leivas Job (secretário de Segurança do RS), Átila Rohrsetzer (diretor da Divisão Central de Informações do Dops/RS), e o delegado Marco Aurélio da Silva Reis (diretor do Dops).

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ENTREVISTA - 'Objetivo era detectar presença no Brasil de líderes estrangeiros'

Expedito Filho, BRASÍLIA

Marival Chaves: ex-sargento do DOI-Codi

Segundo militar que analisou documentação, Operação Condor começou nos anos 60 e durou até década de 80

Responsável pela leitura da documentação sobre a Operação Condor no Brasil, o ex-sargento do DOI-Codi Marival Chaves contou ao Estado que militares argentinos, chilenos, uruguaios e paraguaios viajaram ao Brasil para efetuar treinamento no início da operação. Depois dessa primeira fase, os militares brasileiros atuaram de forma conjunta com os militares das ditaduras vizinhas em ações de inteligência para monitorar, prender e até eliminar os militantes de outros países que buscavam apoio de organizações de esquerda que combatiam a ditadura.

Ele informou que a ditadura argentina chegou a pagar US$ 20 mil por mês para que o Exército brasileiro vigiasse os ativistas daquele país. Segundo Marival, a ligação estreita entre os serviços secretos do País e das nações vizinhas começou na década de 60, quando chefes e agentes chegaram a São Paulo para iniciar uma preparação.

Como é que se deu no Brasil a Operação Condor?

O CIEx (Centro de Informação do Exército), por intermédio de suas agências avançadas no Rio e em São Paulo, em conjunto com o serviço secreto do Exército e Marinha argentina, estabeleceu uma série de operações de informação, usando infiltrados desses países, para controlar ativistas que transitavam pelo território nacional.

Quem era monitorado ou vigiado de perto?

O CIEx monitorava as atividades de chilenos do Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), argentinos do Movimento Peronista Montonero (MPM) e Exército Revolucionário do Povo (ERP) e uruguaios, particularmente refugiados políticos. O objetivo principal era detectar a presença no Brasil de líderes estrangeiros de organizações de esquerda, como Fernando V. Navaja, Mário Henrique. Eram expoentes, um do MPM, braço armado do peronismo.

A Operação Condor durou até que ano?

Em outubro de 1985, a estrutura foi desarticulada em virtude da ação do general Leônidas Pires Gonçalves, ministro do Exército do governo Sarney (1985/1990). Duas operações desenvolvidas pelo CIEx em conjunto com o serviço secreto da Marinha e Exército argentinos merecem destaque. Na primeira, o líder do MPM - acho que ele é desaparecido - foi preso, morto, colocado em embalagem e o corpo despachado pelas Aerolineas Argentinas, que era estatal. Na segunda, é criada uma organização política fictícia com atuação clandestina no Rio, essa é a Operação Gringo, um das financiadas pelo governo argentino. Era dirigida por um infiltrado de origem argentina, ex-ativista do MPM, que mantinha relações com refugiados estrangeiros, organizações da esquerda brasileira. Em 1982, em uma das viagens a Cuba desse agente infiltrado pela Operação Condor, os cubanos, duvidando de sua idoneidade, submeteram-no a interrogatórios, aplicando-lhe tortura. Pegaram ele e desmontaram a farsa.

Quem coordenava no Brasil a Operação Condor?

Era o escritório do Rio de Janeiro. Eram duas pessoas do CIEx, sendo uma delas o chefe, que era quem delegava as funções de ligação.

A operação abrangeu diversos governos, já que foi da década de 60 a 80. Então foram vários chefes?Durante o tempo em que perdurou a aliança com a Argentina, o chefe do CIEx e seus similares argentinos, do Exército e da Marinha, promoveram uma série de conferências bilaterais no Brasil e nos respectivos países, deliberando estabelecimento de táticas e técnicas estratégicas unificadas para fazer face às ações que poderiam constituir risco iminente em razão da escalada do movimento comunista.

Isso é um documento?

Sim. Tudo isso são anotações e informações que eu retirei de documentos do CIEx. Eu li a operação. No CIEx eu era encarregado de ler essa operação.

E o Chile? Lá a Operação Condor foi mais violenta. Qual a relação do Brasil com o Chile?

Eu tenho notícia de que o Chile, através de seu serviço secreto, não sei se do Exército ou Marinha, plantou infiltrados em São Paulo. Desenvolveu operação com a agência do CIEx em São Paulo onde os infiltrados chilenos tinham objetivo de exercer controle sobre os chilenos que aqui estavam.

E o casal uruguaio Lílian Celibert e Universindo Diaz também foi preso a partir de informações coletadas pela Operação Condor?

Não tenho dúvidas. Eles foram presos no Rio Grande do Sul. A Operação Condor teve início na década de 60, quando os militares chilenos e argentinos vieram para o Brasil participar de treinamentos no DOI de São Paulo. O DOI de São Paulo foi que treinou. Foi o coronel Valdir Coelho. Tem início aí a ligação dos serviços secretos de Brasil, Chile e Argentina. Os uruguaios estiveram aqui no Brasil também treinando. Era treinamento de rua, de vigilância, interceptação de correspondência, de entrada - penetrar na edificação sem deixar vestígio. Aí, de fato se deu a cooperação bilateral. O Paraguai também recebeu treinamento no Brasil. Os agentes participavam de operações de rua reais e os chefes de conferências no quartel-general do então 2º Exército.

Quem é: Marival Chaves

Baiano da cidade de Castro Alves, tem 61 anos e foi sargento do DOI-Codi e do Centro de Informação do Exército (CIEx).

Marival Chaves ficou conhecido na década de 90, quando fez uma série de revelações sobre tortura e morte de presos políticos

para o projeto Brasil: Nunca Mais.

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