Presidência lançará campanha publicitária para mostrar que o etanol produzido no país não colabora com o aumento do preço dos alimentos. Para Lula, petroleiras tentam desprestigiar o biocombustível
Lima — O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrentou ontem uma batalha quase solitária em defesa dos biocombustíveis durante a 5ª Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da América Latina, Caribe e União Européia, na capital peruana. As dúvidas sobre o impacto da fabricação de etanol na escassez global de alimentos foi comentada por diversos líderes dos dois lados do Atlântico. Sem se intimidar, o assessor especial da Presidência da República Marco Aurélio Garcia disse que o Brasil lançará uma “ofensiva publicitária internacional” para defender o produto.
Na quinta-feira, ao desembarcar em Lima, Lula já havia demonstrado indignação com as críticas contra o álcool combustível. Ele afirmara que “há uma disputa comercial no mundo” e que as “petroleiras estão por trás” da campanha de desprestígio do etanol. Segundo o presidente, o debate está só começando e será “longo e duradouro”. O maior consumo de comida em países emergentes, aliado ao aumento do preço do petróleo, causou uma inflação dos alimentos. Governantes contrários à transformação do etanol em commodity colocam a culpa nas plantações de milho e cana-de-açúcar destinadas ao combustível, que estariam ocupando o espaço de lavouras para alimentação.
“Pressionados não. Nós temos é recebido cada vez mais adesão a essa política e vamos, evidentemente, iniciar uma ofensiva publicitária internacional para esclarecer isso”, afirmou Marco Aurélio. Ele lembrou que o Brasil sediará uma conferência sobre o tema em novembro, na cidade de São Paulo. “Queremos que venham não somente os que estão de acordo, mas também os críticos, porque queremos que essa questão seja definitivamente esclarecida do ponto de vista científico.”
Durante a sessão plenária da cúpula e as reuniões bilaterais, Lula se deparou com as mais diferentes posições sobre o assunto, desde o radicalismo de países produtores de petróleo e de movimentos de defesa do meio ambiente — que realizaram manifestações contrárias aos combustíveis fósseis em diversos pontos do país —, até a posição cautelosa de chefes de governo como o espanhol José Luis Rodríguez Zapatero. “Creio que é cedo para dizer se há uma relação entre as duas coisas. Alguns dizem que há, outros que não. Qualquer posição é precoce”, esquivou-se Zapatero ao ser questionado sobre a suposta relação entre o etanol e a crise de alimentos.
Diante da polêmica, os 60 participantes da cúpula decidiram incluir a análise sobre os benefícios e desvantagens dos biocombustíveis entre os 11 itens constantes da Declaração de Lima (leia o quadro nesta página). O grupo de trabalho relativo a esse tema concluiu que “os biocombustíveis deverão cumprir requisitos sustentáveis, ecológicos, sociais e econômicos”.
As fontes alternativas de energia receberam um apoio indireto do anfitrião do encontro, o presidente do Peru, Alan García, durante seu discurso na abertura da cúpula. Ele pediu que os participantes discutissem a possibilidade de aumentar tarifas sobre o petróleo, destinando os recursos a um fundo de reflorestamento da Amazônia.
Itaipu
Durante a cúpula, Lula participou de seis reuniões com chefes de Estado, entre eles, o presidente da Comissão Européia, o português José Manuel Durão Barroso, que pela manhã presenciou um ato do Greenpeace em Machu Picchu contra os biocombustíveis. O brasileiro também se encontrou com os primeiros-ministros da Jamaica e da Polônia, e os presidentes da Bulgária e do Paraguai. A reunião com o paraguaio Fernando Lugo — chefe de Estado eleito — estava cercada de expectativas, já que o ex-bispo promete cobrar do Brasil uma revisão do Tratado de Itaipu.
Lugo acompanhou Nicanor Duarte, atual presidente do Paraguai, na conversa com Lula. Um integrante da comitiva de Assunção, no entanto, contou que tanto Lugo quanto Duarte entenderam que a ocasião não era adequada para discutir os termos do contrato, pois o tema principal da cúpula era cooperação para combate à pobreza. “É preciso ter em mente que o Paraguai tem uma reserva energética privilegiada e precisa colher esses benefícios. Não corremos o risco de países como o Brasil, que viveu recentemente uma crise de energia grave”, disse o presidente eleito, que tomará posse em agosto.
Segundo Marco Aurélio Garcia, mudanças no acordo não estão nos planos do Brasil. “No encontro, o presidente Lula apenas reiterou que, se mantidos os compromissos históricos entre os dois países, queremos sem dúvida impulsionar a cooperação”, afirmou. Hoje, os presidentes do Mercosul terão reuniões com os líderes europeus que foram a Lima — alguns deles, como o britânico Gordon Brown e o francês Nicolas Sarkozy, não compareceram. Lula almoçará com peruano García antes de voltar para o Brasil. (CB)
Ofensiva brasileira na Cúpula de Lima
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