Retificado acordo ortográfico com países de língua portuguesa
O blog havia adiantado os termos do acordo aqui confira.
PORTUGAL
Intelectuais temem que texto polêmico represente submissão à língua brasileira. Mudanças começam a valer nos livros escolares em 2010
* Carlos Pinto Coelho
“Uma gordura viscosa que vai se meter à força num churrasco que era, até agora, requintado e gostoso.” Carlos Pinto Coelho, um dos jornalistas e escritores mais famosos de Portugal, adotou essa metáfora para justificar sua oposição ao Segundo Protocolo do Acordo Ortográfico, aprovado ontem por maioria no Parlamento, em Lisboa. De acordo com os críticos, o documento representa uma submissão à língua portuguesa difundida no Brasil, por padronizar algumas grafias (veja quadro). Eles também sustentam que a supressão da consoante muda em palavras como “óptimo” e “acção” e da letra “h” em palavras como “húmido” indicam uma inclinação ao brasileirismo. Coelho e 153 personalidades dos meios acadêmico, cultural e artístico de Portugal tentaram, em vão, impedir a suposta agressão à cultura lusa ao liderarem um abaixo-assinado com 33 mil nomes de cidadãos contrários ao documento. O Partido Socialista, Partido Social-Democrata, o Bloco de Esquerda e sete deputados do Centro Democrático Social (CDS) votaram a favor do texto. As mudanças valerão a partir de 2010.
Para portugueses como a professora aposentada Fátima Quintiliano, moradora de Lisboa, o Acordo Ortográfico ameaça a cultura de Portugal e impõe dificuldades à população. “Já estou cansada para aprender português novamente e sei que para os idosos será ainda mais complicado”, afirma a mulher de 63 anos. “Por que os brasileiros não aprendem então a falar o nosso português?”, questiona. Fátima lembra que seu país e o Brasil têm seus próprios encantos. “Adoro o Brasil e suas falas, mas acho que as culturas não devem ser misturadas”, opina.
Morador do Funchal (Ilha da Madeira), o mestrando de engenharia biomédica Eduardo Freitas se confessa “magoado” com a aprovação do acordo. “Trata-se de uma colonização por parte do Brasil, acerca da própria língua portugesa”, ataca. Ele lembra que muitas palavras têm significados diferentes no Brasil e em Portugal. “O termo ‘time’, por exemplo, não existe na nossa língua. Já ‘rapariga’ tem sentido pejorativo no Brasil, mas não em meu país”, exemplifica.
Debates sobre submissão da cultura portuguesa à parte, o jornalista Carlos Coelho se ressente do fato de os parlamentares não terem levado em conta as “firmes vozes de alguns dos nossos mais ilustres técnicos e pensadores da língua”. Segundo ele, intelectuais foram pessoalmente ao Parlamento explicar os riscos da adesão ao Acordo. “Os nossos legisladores não lhes deram atenção”, lamenta-se. “Não vingou a grande política da língua e da cultura, nem sequer tiveram o bom senso de mandar arquivar a questão no baú das velharias inúteis”, acrescenta.
O Acordo Ortográfico tem o objetivo de unificar a grafia do português e foi obtido em 1990. O documento deveria ter entrado em vigor em 1994, mas somente Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe aprovaram o texto. O Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa contra o Acordo Ortográfico, assinado pelos lingüistas de Portugal, considera que o documento pretende “impor uma reforma da maneira de escrever mal concebida, desconchavada, sem critério de rigor”. Ainda de acordo com o manifesto, “a reforma não só é desnecessária, mas perniciosa e de custos financeiros não calculados”.
Não vingou a grande política da língua e da cultura, nem sequer tiveram o bom senso de mandar arquivar a questão no baú das velharias inúteis
* jornalista português
Modificações no idioma
Principais alterações na grafia da língua portugesa em Portugal
Desaparecem o “c” e o “p” mudos, como “acção”, “acto”, “adopção” e “óptimo”, que passam a ser escrito como no modo brasileiro
A letra “h” de palavras como “húmido” deixa de existir — a grafia adotada também será a mesma já usada no Brasil
O trema será abolido, a não ser em nomes próprios e seus derivados
O acento agudo não será mais usado em ditongos abertos “ei” e “oi” de palavras paroxítonas, como “assembléia” e “jibóia”
Não haverá mais acento agudo nas palavras paroxítonas, com “i” e “u” tônicos, quando precedidos de ditongo. Exemplos: “feiúra” e “baiúca” passam a ser grafadas “feiura” e “baiuca”
O acento também deixará de existir nas formas verbais que possuam o acento tônico na raiz, com “u” tônico precedido de “g” ou “q” e seguido de “e” ou “i”. Exemplos: “averigúe” e “argúe”
Não se usará mais acento para diferenciar “pára” (verbo parar) de “para” (preposição); péla (verbo pelar) de “pela” (preposição + artigo); “pélo” (verbo pelar), “pêlo” (substantivo) e “pelo” (preposição + artigo); “pêra” (substantivo), “péra” (substantivo arcaico que significa pedra) e “pera” (preposição arcaica)
O alfabeto passará a ter 26 letras, com a inclusão das letras “k”, “w” e “y”
O acento circunflexo será suprimido nas terceiras pessoas do plural do presente do indicativo ou do subjuntivo dos verbos “crer”, “dar”, “ler”, “ver” e seus derivados. A grafia correta passará a ser “creem”, “deem”, “leem” e “veem”
Ao contrário da norma usada no Brasil, o circunflexo também será abolido em palavras terminadas em hiato “oo”, como “enjôo” (“enjoo”) e “vôo” (“voo”)
Comentários