Lições de jornalismo
A carta de Rodrigo Vianna
Ilustrativa a mensagem de despedida do repórter da Globo, inconformado com a cobertura das eleições Eis um clássico da história do jornalismo à brasileira. Personagem um, Rodrigo Vianna, ótimo profissional e cidadão honrado, consciente das responsabilidades de mister. Dois, a Globo, que dispensa apresentações. A renovação do contrato de Rodrigo, leal funcionário há 11 anos, estava marcada para o próximo janeiro. Esta semana, ele foi informado que não continuaria na organização. Momentos após, ao deixar a sede da emissora, descobriu que seu crachá já não o habilitava a passar pela catraca. Rodrigo e outros jornalistas da equipe não se conformaram com a linha imposta pela direção para a cobertura da recente campanha eleitoral, sobretudo nas semanas que precederam o primeiro e o segundo turno. Linha caracterizada por mentiras e omissões, a fim de favorecer a candidatura tucana. Trata-se de mais um capítulo de um enredo sem-fim, protagonizado pelos patrões da mídia nativa. Clamam assiduamente pela liberdade de imprensa, e de opinião em geral, mas é a liberdade que eles próprios pretendem para cuidar dos seus negócios nem sempre límpidos e manter os privilégios. Contam com a pronta colaboração de um exército de sabujos. Rodrigo Vianna não é um desses.
A todos os empregados da Globo, Rodrigo remeteu longo e-mail pelo intranet da organização. Selecionamos três trechos, que falam por si. :: Ao lado de um grupo de colegas, entrei na sala de nosso chefe em São Paulo, no dia 18 de setembro, para reclamar da cobertura e pedir equilíbrio nas matérias: “Por que não vamos repercutir a matéria da IstoÉ, mostrando que a gênese dos sanguessugas ocorreu sob os tucanos? Por que não vamos a Piracicaba, contar quem é Abel Pereira?” Nenhuma resposta convincente. E uma cobertura desastrosa. Será que acharam que ninguém ia perceber? Quando, no JN, chamavam Gedimar e Valdebran de “petistas” e, ao mesmo tempo, falavam de Abel Pereira como empresário ligado a um ex-ministro do “governo anterior”, acharam que ninguém ia achar estranho? Faltando seis dias para o primeiro turno, o “petista” Humberto Costa foi indiciado pela PF. No caso dos vampiros. O fato foi parar em manchete no JN, e isso era normal. O anormal é que, no mesmo dia, esconderam o nome de Platão, ex-assessor do ministério na época de Serra/Barjas Negri. Os chefes sabiam da existência de Platão, pediram a produtores pra checar tudo sobre ele, mas preferiram não dar. Que jornalismo é esse, que poupa e defende Platão, mas detesta Freud! Deve haver uma explicação psicanalítica para jornalismo tão seletivo! :: Os telespectadores da Globo nunca viram Serra e os tucanos entregando ambulâncias cercados pelos deputados sanguessugas. Era o que estava na tal fita do “dossiê”. Outras TVs mostraram o vídeo, a internet mostrou. A Globo, não. Provava alguma coisa contra Serra? Não. Ele não era obrigado a saber das falcatruas de deputados do baixo clero. Mas por que demos o gabinete de Freud pertinho de Lula e não demos Serra com sanguessugas? E o caso gravíssimo das perguntas para o Serra? Ouvi, de pelo menos 3 pessoas diretamente envolvidas com o SP-TV Segunda Edição, que as perguntas para o Serra, na entrevista ao vivo no jornal, às vésperas do primeiro turno, foram rigorosamente selecionadas. Aquele diretor (aquele, vocês sabem quem) teria mandado cortar todas as perguntas “desagradáveis”. A equipe do jornal ficou atônita. Entrevistas com os outros candidatos tinham sido duras, feitas com liberdade. Com o Serra, teria havido, deliberadamente, a intenção de amaciar.
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