Praga nacional

É nacional a desenvoltura de quadrilhas especializadas no surrupio de verbas municipais. Esse "negócio", milionário e rentável seria, segundo as investigações policiais avançam para esclarecer o desaparecimento dos irmãos do deputado estadual peemedebista Alessandro Novelino, uma das especialidades de Chico Ferreira & Cia.

Leiam como está a "praga" no cenário nacional.

QUADRILHAS REGIONAIS

Lúcio Vaz
Correio Braziliense
30/4/2007

Auditoria do TCU revela que grupos locais se organizam em municípios para fraudar contratos e desviar recursos repassados por ministérios, quase sempre para atender a emendas de parlamentares ao Orçamento

O esquema montado pela máfia dos sanguessugas para fraudar a compra de ambulâncias com recursos do Orçamento da União não foi um fato isolado. Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 21 municípios, distribuídos por 15 estados, revela a existência de quadrilhas locais ou regionais organizadas para fraudar contratos e desviar dinheiro público. Também são apontadas falhas no planejamento das obras, na celebração dos convênios, na sua execução e na fiscalização dos repasses pelos órgãos do governo. A maior parte das obras foi financiada com recursos de emendas de parlamentares ao Orçamento.

Os convênios foram assinados com 10 ministérios — Saúde, Educação, Cidades, Agricultura, Integração Nacional, Desenvolvimento Agrário, Esporte, Turismo, Cultura e Justiça — num custo total de R$ 15,3 milhões. Dinheiro investido em unidades móveis e equipamentos de saúde, casas populares, quadras esportivas, barragens, recuperação de estradas vicinais, pavimentação de ruas, perfuração de poços, capacitação de professores. Foram apontadas irregularidades em mais da metade dos 21 municípios, muitas delas graves.

O relatório dos auditores ressaltou a descoberta de fraudes de licitações mediante conluio de empresas, utilização de firmas fantasmas, uso de notas fiscais frias e “calçadas” (com valor diferente na primeira via), falsos boletins de medições para justificar pagamentos indevidos, superfaturamento e a identificação de teias de relações de empresas que fraudam licitações em diversos municípios do mesmo estado. “As constatações ultrapassam os limites de simples irregularidades administrativas e constituem autênticos crimes contra a administração pública”, diz o relatório.

As falhas ocorrem desde a fase de celebração dos convênios. A falta de planejamento e de estudos de viabilidade provocam a existência de obras que não servem às comunidades, segundo relatam os auditores. Inaugura-se a obra, mas ela não funciona. São escolas sem professores; postos de saúde sem remédios nem médicos; máquinas, equipamentos e aparelhos que não funcionam por falta de manutenção ou de pessoal qualificado para operação; estradas e pontes que ligam nada a lugar nenhum; esgoto sanitário onde não há banheiros; barragens onde não existem rios.

Emendas
Para o TCU, somente quando a celebração de convênios tiver como parâmetro programa ou política pública definida, com objetivos claros a serem atingidos, é que essa realidade será modificada. “De maneira geral, não há critérios técnicos determinantes para a concessão de transferência voluntária a um determinado município ou entidade. Essa concessão não obedece a um plano de governo que tenha os objetivos de minorar necessidades, diminuir carências e estimular setores. As transferências acontecem aleatoriamente, normalmente para atender emendas parlamentares inscritas no Orçamento da União”, diz o relatório.

A falta de análises detalhadas do custo do objeto proposto pode causar tanto o superfaturamento — que possibilita a ocorrência de fraudes e desvio de recursos — quanto o subfaturamento — que implica inexecução, execução parcial do objeto ou utilização dos recursos em finalidade diversa —, situações que causam prejuízo ao erário e à população.

Falhas do governo
O relatório também aponta falhas dos órgãos do governo federal. A não observância, pelos órgãos concedentes, das exigências legais para a celebração de convênios é uma constante. Documentos não são exigidos, certidões não são apresentadas, outras têm validade vencida, pareceres técnicos ou jurídicos apresentam conteúdo inconsistente, a regularidade fiscal e cadastral dos convenentes não são pesquisadas. A inobservância desses requisitos legais também possibilita a ocorrência de fraudes e desvio de dinheiro público.

O relatório do ministro Benjamin Zymler, feito com base no trabalho dos auditores e aprovado pelo plenário do TCU no dia 18 deste mês, manifesta “desapontamento” e “indignação” com o quadro apurado: “O resultado dos trabalhos aponta falhas estruturais que maculam todo o processo de transferência, carreando recursos para órgãos e entidades cujas necessidades mostram-se questionáveis. Falhas, fraudes e desvios comprometem a programação e orientação dos parcos recursos federais destinados às ações de saúde, educação, infra-estrutura. A gestão desses recursos revelou-se um nicho profícuo para perpetração de inúmeras irregularidades”. Ele diz que os atuais mecanismos oficiais de fiscalização não são eficazes para alterar o quadro de irregularidades e defende a implementação e difusão de mecanismos de controle social.

O tribunal também apontou falhas na fiscalização da execução dos convênios. Mesmo quando realizada, a fiscalização busca, quase que exclusivamente, a aferição de aspectos legais e de execução financeiras, em detrimento da avaliação da utilidade e do alcance dos objetivos sociais da transferência voluntária. Assim, a avaliação da construção do posto de saúde sobrepõe-se ao fato de não haver médicos para atendimento; a construção da escola é mais importante do que o fato de não haver professores; a aquisição do ônibus é mais relevante do que o fato de o veículo não trafegar por falta de peças.

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