``Fidel é o único mito vivo na história da humanidade, e acho que ele construiu isso à custa de muita competência, muito caráter, de muita força de vontade e também de muita divergência, de muita polêmica´´
Do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante visita ao gasoduto Sudeste-Nordeste, na cidade capixaba de Serra
O governo brasileiro reagiu de forma cautelosa à renúncia do ditador cubano, Fidel Castro. Durante visita ao estado do Espírito Santo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu que, até então, temia pela sucessão na ilha. O medo era de que "numa situação adversa, acontecesse um sistema turbulento". Lula desfiou um curto rosário de elogios ao ex-líder guerrilheiro. "Fidel é o único mito vivo na história da humanidade, e acho que ele construiu isso à custa de muita competência, muito caráter, de muita força de vontade e também de muita divergência, de muita polêmica", declarou, segundo despacho divulgado pela assessoria de imprensa do Palácio do Planalto.
O presidente evitou qualquer opinião conceitual sobre o futuro de Cuba sem Castro à frente do governo. Preferiu uma espécie de discurso preventivo nesse campo. "Respeito muito que cada povo decida seu regime político — esse negócio de a gente ficar aqui no Brasil dizendo que bom é assim, bom é assado. Vamos deixar que os cubanos cuidem do que eles querem na política." Dada a deixa, ele foi em frente: "Os cubanos têm maturidade para resolver todos os seus problemas sem precisar de ingerências, nem brasileiras nem americanas".
Próximos desde 1985, Lula e Fidel se entrevistaram pela última vez em janeiro passado. O brasileiro esteve em Cuba para uma visita oficial e assinou 10 acordos bilaterais nas áreas de energia, saúde, comércio, agricultura e informação digital. Foi submetido a uma espera de horas, antes de finalmente encontrar Castro — o que deixou clara uma certa insatisfação do regime castrista com o Brasil. Dias depois, o próprio ditador revelou, em artigos publicados na imprensa oficial, o motivo da arenga: a promoção dos biocombustíveis, produto que aproximou Lula do presidente norte-americano, George W. Bush, e que, segundo Fidel, aumentará o preço dos alimentos no mundo num futuro próximo.
À saída daquele encontro, o presidente brasileiro não quis revelar o teor tenso da conversa. Aos jornalistas brasileiros que o acompanhavam, Lula disse que encontrou Castro "com uma saúde impecável". "A impressão que eu tenho é que Fidel está muito bem de saúde, está com uma lucidez como nos melhores momentos. E eu penso que Fidel está pronto para assumir o papel político que ele tem em Cuba e assumir o papel político que ele tem na história do mundo globalizado e da humanidade." Mas a saúde do ditador não só não estava boa, como piorou desde então.
No Itamaraty, a renúncia também foi recebida com muita cautela. O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, se limitou a dizer que reconhece a importância da figura de Fidel Castro na política internacional. E, meio que ratificando os acordos bilaterais, comentou que mantém a expectativa de intensificar as relações econômicas e comerciais com Cuba. Amorim afirmou que o Brasil manterá a atitude de engajamento e de bom relacionamento político com o governo caribenho.
Embora o assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, não tenha feito nenhuma declaração — está em viagem à França e chegaria nesta madrugada ao Brasil —, o ministro da Justiça, Tarso Genro, veio a público comentar a troca de poder em Cuba. Segundo ele, a decisão de Fidel Castro foi "madura". "Não só porque suas condições de saúde apontam para a necessidade de sua retirada, mas também porque tudo indica que está em curso em Cuba um processo de renovação política, de renovação institucional e de rediscussão do processo de revolução".
Cuba: Especial Correio Braziliense - Parte VIII: Lula elogia ditador e condena ingerências
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