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Seminário internacional expõe divergência sobre modelo de regularização fundiária na Amazônia

Foto: Gilberto Nascimento











Deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA) defende, em discurso na Câmara, proposta da SAE para acelerar a regularização fundiária.


Val-André Mutran (Brasília) – O seminário internacional "O Desafio da Regularização Fundiária na Amazônia", realizado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República e o Banco Mundial (Bird) reuniu especialistas, autoridades e representantes de entidades da sociedade civil para discutir temas como a definição do tamanho das glebas de terra que seriam regularizadas na Amazônia.

Segundo o consenso entre governo, ong´s e iniciativa privada, sem a regularização, titulação e ordenamento fundiário, a região jamais estará preparada para a implementação de um novo modelo de desenvolvimento sustentável e os problemas que a afligem persistirão.

Ong´s como Amigos da Terra e Imazon participaram do evento aberto pela Ministra Chefe da Casa Civil Dilma Roussef, que admitiu que o tamanho do desafio para a regularização fundiária "será um esforço hercúleo deste governo, mas o faremos", prometeu a mais importante colaboradora do governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva.

O ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, expôs novamente as ações de fundo do Plano Amazônia Sustentável e defendeu a criação de órgão ou agência especial pelo governo federal para acelerar a regularização fundiária na região.

Participaram, ainda, do seminário, os presidentes do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, e do presidente do Congresso Nacional Garilbaldi Alves Filho (PMDB-RN), deputados federais e senadores.

As entidades que compõem o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA) realizam de manhã ato público em frente ao prédio do Banco Mundial em Brasília, em protesto ao atual modelo de ocupação da Amazônia que, segundo os manifestantes, é excludente, estimula a grilagem, o desmatamento e se utiliza do trabalho escravo em plantios de grãos e criação de gado extensiva, sendo os principiais responsáveis pelo desmatamento ilegal no Bioma Amazônia, acusaram.

Proposta – O plano do governo para a regularização fundiária da Amazônia - onde apenas 4% das terras em mãos de particulares são legais - prevê a doação dos lotes de até 400 hectares aos atuais ocupantes, informou o ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger.

De acordo com informações de Mangabeira, as propriedades de 401 a 1,5 mil hectares terão as medidas de regularização aceleradas, acabando com a burocracia hoje existente; de 1,501 mil a 2,5 mil hectares, cuja venda depende de licitação, o governo vai procurar um jeito de tornar as regras mais ágeis; e, de 2,501 mil hectares para cima, abrirá caminho para a retomada, pela União, da terra grilada por fazendeiros e empresas.

O ministro informou ainda que a União deverá repassar aos municípios as terras onde foram construídas cidades e que hoje estão irregulares. "É uma situação absurda, pois dezenas de municípios nasceram em cima de terras da União e os lotes deles são ilegais", disse Mangabeira.

A tarefa está dividindo o próprio governo federal, a partir da proposta de criação de um órgão para coordenar a regularização fundiária na Amazônia, proposta pelo ministro Mangabeira Unger.

A divisão ficou clara com a reação contrária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que terá suas funções esvaziadas caso o presidente Lula concorde com uma das alternativas – uma agência executiva ou uma autarquia semelhante ao Inmetro – que repousam atualmente na mesa da ministra Dilma Roussef, da Casa Civil.

"Esse órgão não é necessário. É bobagem", reagiu ontem o presidente do Incra, Rolf Hackbart, que se recusou a participar do seminário.

Hackbart diz que as discussões que interessam estão ocorrendo no âmbito de um grupo de trabalho coordenado pela Casa Civil.

"O debate promovido pela SAE é bom, mas nós já estamos discutindo esse assunto com a ministra Dilma", garante o presidente do Incra.

Ele afirma que a proposta de criação de um novo órgão, em nome da criação de um polo de desenvolvimento sustentável, resultaria na distribuição de terras num modelo exclusivamente capitalista e sem critérios de avaliação de quem ocupa atualmente as terras ou do impacto ambiental.

"A destinação do patrimônio ao desenvolvimento deve ser um não à farra fundiária e um não à criação de commodities para vender no mercado", afirma Hackbart."

Cautelosa e informada sobre as divergências entre os dois órgãos, a ministra Dilma Rousseff explicou ontem que o governo estuda a proposta de Unger, ainda não tem um formato sobre como deverá ser o novo órgão, mas está preocupado com o caos fundiário que jogou na ilegalidade mais de 96% de um vasto território que representa mais de 60% da superfície do Brasil.

"A regularização fundiária da Amazônia é estratégica. Se não colocar um marco legal, fica difícil fazer uma proposta de desenvolvimento sustentável para a região", disse a ministra.

Reação de apoio – A reação contrária do Incra teve repercussão imediata na Câmara dos Deputados.

Presente ao seminário, o deputado federal Giovanni Queiroz (PDT-PA) disse que "Achamos extremamente interessante a sugestão do Ministro de termos um novo órgão para trabalhar a regularização fundiária no Brasil. Isso é extremamente importante. Na verdade, o INCRA ficaria cuidando apenas da reforma agrária em si. Até porque, o INCRA não dá conta de fazer regularização fundiária. Até mesmo projeto de assentamento de reforma agrária, o INCRA tem dificuldades de fazê-lo. Foi delegado ao INCRA, por exemplo, fazer a certificação do georreferenciamento das áreas e a tarefa está mais do que atrasada", exemplificou.

Queiroz apontou suas críticas ao órgão fundiário que, no seu entendimento está aquém das expectativas da sociedade. "No Pará, como em outros Estados brasileiros, o INCRA não tem condições de colocar técnicos para fazer a certificação. Isso leva a um acúmulo de processos, como temos em Marabá, em Belém. Não existem técnicos capazes de fazer certificação daquilo que por lei, nós, proprietários rurais, somos obrigados a fazer. Não recebemos a certificação porque o INCRA não tem pessoal qualificado para fazê-la."

As críticas foram estendidas a atuação do INCRA nos Projetos de Assentamento. "O ICRA não consegue nem mesmo fazer um assentamento responsável, direito, ordenado, organizado, assistindo o trabalhador para que ele possa produzir efetivamente, cuidar da família, mas também ganhar dinheiro. Temos de sair desse momento de entender que trabalhador rural tem que nascer pobre, viver miseravelmente e morrer pobre. Temos que lhe dar alternativas econômicas para que ele possa sonhar em formar o filho doutor. As condições impostas pelo projeto de assentamento de reforma agrária sujeitam o homem a ser escravo da terra a vida toda", criticou Giovanni Queiroz.

O parlamentar apoiou a indicativa da SAE. "Quero aplaudir o Governo Lula, na pessoa do Ministro Mangabeira Unger, responsável pelo Plano Amazônia Sustentável, que vem ao encontro realmente de um clamor maior, eliminando esse caldo de cultura, de conflitos que é a não-regularização fundiária na Amazônia. Em regularizando, sem dúvida alguma, vamos abrir as portas do crédito, dar condição de maior produção e estabilidade jurídica ao produtor rural, para que este possa realmente trabalhar a sua terra, gerando emprego e renda", destacou Queiroz.

Aprovada criação da Secretaria de Assuntos Estratégicos

A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2300/07, que criou a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. O filósofo Mangabeira Unger, que chegou a classificar o governo Lula como “corrupto” durante o escândalo do mensalão, é o titular dessa pasta.

Em setembro passado, o Senado rejeitou uma medida provisória que criava a então Secretaria de Ações de Longo Prazo, também conhecida pela sigla Sealopra. O principal responsável pela rejeição da Sealopra no Senado foi o PMDB, que aderiu à oposição naquela votação. A sigla pleiteava naquele momento mais espaço no primeiro escalão do governo.

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