Lulinha paz e amor uma ova!

Análise da Notícia


Trégua teve vida curta

Gustavo Krieger - Da equipe do Correio

Como era de se esperar, não durou muito a trégua verbal entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a oposição. O presidente andava comportado porque precisava da boa vontade dos líderes oposicionistas para aprovar a emenda constitucional que preserva a DRU (Desvinculação das Receitas da União) até 2011. Um dia depois da votação, voltou ao ataque ao falar na “pobreza de espírito” dos adversários.

As declarações de Lula no café-da-manhã com os jornalistas são importantes pelo que revelam abertamente e pelo que não conseguem esconder. O presidente jura que não “perdeu nem meio minuto” de sono depois que o Senado rejeitou a CPMF e privou seu governo de uma arrecadação de R$ 40 bilhões. Mas deixa claro não ter perdoado os adversários que lhe impuseram essa derrota. Negou que vá lançar “pacotes econômicos em dezembro”, mas admitiu “medidas administrativas emergenciais em janeiro”. A entrevista mostra que Lula está recolhido, pensando nos próximos movimentos. Mas não recomenda-se acreditar em suas juras de moderação.

Da mesma forma, é bom ficar de pé atrás sobre outras promessas, como a manutenção de ministros e a de tirar das gavetas as reformas política e tributária. A cada vez que um político faz seu balanço de final de ano e coloca seus planos para o futuro, as duas aparecem como prioridade. E nunca saem do papel.

Ponto a ponto

Queda da CPMF

Segundo o presidente, o governo não errou nas negociações sobre a prorrogação do imposto do cheque, como afirmam ministros e líderes governistas. Perdeu a disputa porque setores da oposição quiseram reduzir seu capital eleitoral. “Alguns acharam que o presidente ia ficar muito forte e fazer o sucessor em 2010. Acho isso uma pobreza de espírito. Me dá pena.” Lula disse que a derrubada da contribuição faz parte da democracia. Mencionou os obstáculos erguidos pelo PT quando era oposição para justificar a tese e, depois, fez um mea-culpa. Na gestão FHC, petistas combateram a CPMF. “Muitas vezes, a gente é vítima do próprio discurso. Demorei muito tempo para aprender o valor das palavras.”

Reação à derrota

“Você viu que eu não fiquei nem um pouquinho nervoso? Não tenho razão para perder nem meio minuto de sono com isso.” Lula se recusou a comentar as medidas que serão adotadas pelo governo para compensar o fim da CPMF. Ratificou a promessa de que nada será divulgado neste ano. “Não tomo decisão com febre alta. Nenhuma medida é certa quando é feita por vingança.” Perguntado sobre a possibilidade de aumento de alíquotas de tributos, não respondeu nem “sim” nem “não”. Não quis dar margens para interpretações, apesar de ter deixado no ar a sensação de que tal medida pode sair do papel. “Falei para os ministros que não quero ouvir a palavra pacote. O Brasil já foi vítima de dezenas e dezenas de pacotes, e isso nunca deu certo.” O presidente adiantou que, se for necessário, baixará “medidas administrativas emergenciais” em janeiro.

Ministério

O presidente afirmou que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, protagonista de fracassadas negociações com o PSDB pela prorrogação da CPMF, continuará no cargo. “O Mantega é um companheiro de mais de 30 anos, da mais alta competência, qualificação e credibilidade.” Dados sobre a expansão do PIB e o crescimento do emprego formal comprovariam a qualidade do trabalho desenvolvido pelo ministro. Lula deu a entender que o PMDB não emplacará o senador Edison Lobão (MA) como novo ministro de Minas e Energia. “Você que vai indicar?”, perguntou a uma jornalista. “Me surpreendo de onde vêm essas notícias.” Na quarta-feira, o presidente jantou com o ministro da Cultura, Gilberto Gil. Jogaram baralho até duas da manhã. Convenceu-o a continuar na equipe. “O Gil é uma pessoa leve. Com ele, não tem tempo ruim.”

Céu de brigadeiro

Lula não vê problemas políticos no horizonte. Declarou, por exemplo, que manterá o diálogo com governadores e prefeitos independentemente de qual partido são. Podem ser tucanos ou “demos”, ressaltou, repetindo expressão que despertou a ira de integrantes do antigo PFL durante as negociações da CPMF. Para dar força à retórica, informou que o governo liberou, na quarta-feira, R$ 300 milhões para as obras do Rodoanel em São Paulo, estado governado pelo tucano José Serra. “Não tenho problema político pela frente.” O presidente defendeu a aprovação das reformas tributária e política, consideradas prioritárias. Disse que enviará a primeira ao Congresso em fevereiro. Sobre a segunda, alegou ser de responsabilidade de deputados e senadores a solução do caso. “A reforma política não é um projeto a ser decidido pelo presidente.”

Crise aérea

O presidente admitiu a possibilidade de problemas no fim de ano. Disse, no entanto, que serão em menor escala do que os registrados anteriormente. E negou que tenha falhado ao não prever o problema. “O governo só tem cinco anos.”

Mercosul

Para garantir o acordo com a Bolívia, Lula disse que falou para Evo Morales que um impasse seria “muito ruim” para as relações entre ambos e entre os dois países. Acrescentou entender o “radicalismo” do colega boliviano. “Quando era deputado, o Evo era cuspido pelos brancos quando andava na rua. Um país onde 80% são índios não pode ter um presidente de olho verde e que fala inglês.” O presidente apostou que as políticas sociais de Morales lhe trarão o apoio da classe média.

Medo da morte

Lula revelou que temeu pelo pior depois de o ministro da Justiça, Tarso Genro, desmaiar na visita à Bolívia. “Achei que ele tivesse morrido.” Com medo, Lula dormiu de porta aberta e luz acesa naquele dia. O presidente elogiou o colega da Venezuela, Hugo Chávez. “Ele tem uma vontade política muito grande com a América do Sul.” Ressaltou que os dois têm a consciência de que é preciso reduzir a diferença das economias da região. E defendeu o Mercosul. “Pode não ser a criança mais bonita, mas é a nossa. Não podemos deixar os outros botarem defeito.”

Economia

Lula esbanjou otimismo. Apostou que a economia crescerá neste ano pelo menos 5%. Foi além. Disse que o percentual pode chegar a 6,5% em 2008 e crescerá ainda mais em 2009. “O Brasil já encontrou o caminho. Por isso, digo que está numa situação privilegiada.” Lula atacou os especialistas que previam a repetição de um PIB modesto no segundo mandato. “Aqueles que torceram para que o país desse errado estão amargando agora o dissabor das coisas estarem acontecendo.” Também criticou a imprensa. Lembrou que “passou 2004 inteiro apanhando” porque anunciou, em agosto de 2003, o “espetáculo do crescimento”. Segundo o presidente, tal espetáculo ocorreu naquele ano, quando o aumento do PIB superou 5%, e será encenado daqui para frente. “O jornalista não pede desculpa. A palavra desculpa não existe no dicionário da imprensa.”

Preocupação

Apesar de desenhar um cenário de céu de brigadeiro, o presidente reconheceu que a crise no mercado financeiro internacional preocupa o governo. “A única coisa que me deixa de antena ligada neste fim de ano é o tal do subprime nos Estados Unidos, que ainda não atravessou o Atlântico.” Não à toa, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, foram escalados para acompanhar diariamente os desdobramentos do caso. “Ninguém sabe o tamanho da crise”, afirmou o presidente, culpando a “irresponsabilidade dos especuladores” pela turbulência. Lula elogiou o trabalho realizado pelo governo na área de infra-estrutura. Rechaçou a possibilidade de apagão energético e prometeu executar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O original e seus similares. “Todos os PACs sairão do papel porque eu assumi o compromisso.” Sem os recursos da CPMF, admitiu, no entanto, que o “PAC da Saúde está travado”.

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