Larry Rother não mora mais no Brasil

O gringo colocou o dedo na ferida

Larry Rother, ex-correspondente do “New York Times”, foi embora, mas ainda é um dos mais argutos observadores das mazelas brasileiras

Bruno Veiga













Larry Rother, jornalista: "Não sinto falta da bagunça e das carteiradas"

O jor­na­lis­ta Larry Ro­ther vol­tou a vi­ver nos Es­ta­dos Uni­dos no ano pas­sa­do, de­pois de tem­po­ra­das no Bra­sil que so­mam qua­se du­as dé­ca­das. Co­mo cor­res­pon­den­te do “New York Ti­mes” se­di­a­do no Rio de Ja­nei­ro (des­de o fi­nal dos anos 70) e ca­sa­do com uma bra­si­lei­ra, Ro­ther vi­veu mo­men­tos im­por­tan­tes da his­tó­ria do pa­ís (co­mo a di­ta­du­ra mi­li­tar e a re­de­mo­cra­ti­za­ção), man­ten­do um ar­gu­to sen­so de ob­ser­va­ção dos even­tos e dos cos­tu­mes bra­zu­cas. A re­vis­ta “Po­der — Joyce Pas­cowitch” (re­vis­ta­po­der.uol.com.br) des­te mês traz uma en­tre­vis­ta in­te­res­san­te com o re­pór­ter grin­go. So­bre Ro­ther, a mí­dia lo­cal gos­ta de abrir man­che­tes com o ca­so de sua qua­se ex­pul­são, em 2004, quan­do es­cre­veu so­bre os há­bi­tos etí­li­cos do pre­si­den­te Lu­la da Sil­va. É uma bo­ba­gem.
O ame­ri­ca­no tem coi­sas mui­to mais re­le­van­tes a fa­lar so­bre es­se es­tra­nho mun­do ver­de-ama­re­lo.

Uma des­sas coi­sas in­te­res­san­tes vem lo­go no co­me­ço da en­tre­vis­ta (fei­ta por Dé­bo­ra Mam­ber e Ro­dri­go Le­vi­no, di­re­to de No­va York). Per­gun­tam do que ele sen­te fal­ta do Bra­sil, após um ano vi­ven­do na Big Ap­ple. Ro­ther não ti­tu­beia e ci­ta pra­ze­res sim­ples: quei­jo mi­nas, go­i­a­ba­da e água de co­co (do sa­bo­ne­te Phe­bo, diz que ain­da não sen­te fal­ta por­que le­vou um es­to­que). E do que dá gra­ças a Deus por ter se li­vra­do: “Não sin­to fal­ta da ba­gun­ça de mo­do ge­ral.
Es­pe­ci­fi­ca­men­te de pes­so­as que fu­ram fi­la, que é al­go im­pen­sá­vel nos Es­ta­dos Uni­dos. Tam­bém não sin­to fal­ta do ´sa­be com quem vo­cê es­tá fa­lan­do?´. Acho que a vi­da nos EUA é um pou­co mais de­mo­crá­ti­ca”. De le­ve e tal­vez sem que­rer, o grin­go foi na veia, re­vol­veu os mais pro­fun­dos pro­ble­mas na­ci­o­nais.
Qua­se tri­vi­al, co­mo se es­ti­ves­se co­men­tan­do so­bre o mo­vi­men­to do Cen­tral Park, Ro­ther ex­pli­cou o Bra­sil em pou­quís­si­mas pa­la­vras.

Pa­ra en­ten­der es­te pa­ís e seus gran­des di­le­mas, nem é pre­ci­so pros­se­guir na re­vis­ta e ler os dois tex­tos (de De­mé­trio Mag­no­li e Rai­mun­do Car­re­ro) acer­ca da cri­se Jo­sé Sar­ney, sen­do o pri­mei­ro um pe­tar­do qua­se de­mo­li­dor so­bre o pre­si­den­te do Se­na­do. Pa­re­ce, por exem­plo, que to­dos os even­tos po­lí­ti­cos re­le­van­tes da se­ma­na pas­sa­da es­tão con­ti­dos nes­sa aná­li­se fru­gal de Ro­ther: ba­gun­ça e fal­ta de de­mo­cra­cia. O Se­na­do (su­as ins­tân­cias se­cre­tas e nem tão se­cre­tas, co­mo o seu Con­se­lho de Éti­ca), o con­cla­ve es­pú­rio Lu­la-Sar­ney-Re­nan-Col­lor, fal­si­da­des da mi­nis­tra-can­di­da­ta, a cri­se no PT e o que mais sur­gir no meio do la­ma­çal. Tu­do po­de ser de­co­di­fi­ca­do pe­la his­tó­ri­ca ca­rên­cia de um mí­ni­mo de or­to­do­xia e re­pu­bli­ca­nis­mo nas re­la­ções de po­der. No meio des­sa zo­na, a im­pres­são é a de que na­da do es­pa­ço po­lí­ti­co no Bra­sil exis­te mes­mo en­quan­to coi­sa co­le­ti­va. É “de­les” e não do po­vo.

Fu­rar fi­las e dar car­tei­ra­das po­dem, in­fe­liz­men­te, ser fe­nô­me­nos tí­pi­cos do co­ti­dia­no do Pa­ís. No li­vro “A ca­be­ça do bra­si­lei­ro”, o so­ci­ó­lo­go Al­ber­to Car­los Al­mei­da ex­pli­ca (com pes­qui­sas) co­mo a cul­tu­ra da ma­lan­dra­gem e do jei­ti­nho es­tá en­fro­nha­da na so­ci­e­da­de bra­si­lei­ra (e co­mo is­so se re­fle­te no “efei­to te­flon”, que pro­te­ge a ima­gem de Lu­la dos es­cân­da­los de sua ad­mi­nis­tra­ção). Por es­se ra­ci­o­cí­nio, se­ria pos­sí­vel abra­çar aque­la des­gas­ta­da te­se de que a clas­se po­lí­ti­ca é ape­nas um re­fle­xo do que é a co­le­ti­vi­da­de. Mas não é is­so que se pro­põe aqui. Es­sa te­se ten­ta ape­nas jus­ti­fi­car ou ame­ni­zar a ação e a cul­pa­bi­li­da­de dos man­da­tá­rios. É ló­gi­co que exis­tem ex­ce­ções em to­das as es­fe­ras — e elas de­vem ser enal­te­ci­das, pois são a úni­ca es­pe­ran­ça de uma sa­í­da de­mo­crá­ti­ca pa­ra o pa­ís. Mas o que se quer di­zer aqui é que es­sas al­mas di­fe­ren­tes for­mam uma pe­que­na mi­no­ria.

A po­lí­ti­ca no Bra­sil (in­clu­in­do exe­cu­ti­vo e le­gis­la­ti­vo) dá mos­tras de es­tar qua­se in­tei­ra­men­te to­ma­da pe­lo re­gi­me do in­te­res­se pró­prio. Co­mo diz Ro­ther em ou­tro tre­cho da en­tre­vis­ta, fal­ta ao Bra­sil um pro­je­to de lon­go pra­zo. É is­so mes­mo e tem a ver com a ba­gun­ça e a fal­ta de de­mo­cra­cia. Os pro­je­tos po­lí­ti­cos pa­re­cem ser in­te­gral­men­te pes­so­ais: pro­je­tos de po­der, e não “pro­je­tos de pa­ís”. Mai­or pro­va des­se fe­nô­me­no é a re­la­ção de Lu­la com o seu PT. Al­guns ci­en­tis­tas po­lí­ti­cos já co­me­çam a clas­si­fi­car es­sa re­la­ção co­mo vam­pi­res­ca: o pre­si­den­te usa a le­gen­da (e a de de­mais ali­a­dos) a seu bel pra­zer (ig­no­ran­do ide­o­lo­gi­as e pro­gra­mas) pa­ra ga­ran­tir a exe­cu­ção de seu pro­je­to pes­so­al. Pro­je­to es­se que, no mo­men­to, é se per­pe­tu­ar no po­der, ele­gen­do uma can­di­da­ta que (sem a po­pu­la­ri­da­de de seu men­tor) não ga­nha­ria nem uma elei­ção de sín­di­co.

In­te­gri­da­de, co­e­rên­cia, dig­ni­da­de, bem co­mum, organização — con­cei­tos pu­e­ris de­mais pa­ra os an­tros nos qua­is a re­al po­lí­ti­ca vem sen­do ope­ra­da em Bra­sí­lia. Al­go pre­ci­sa ser fei­to e se al­guém pen­sar que es­sa mu­dan­ça só acon­te­ce­rá por meio do vo­to, é por­que os bra­si­lei­ros não apren­de­ram a prin­ci­pal das li­ções. Es­sa li­ção é tão sim­pló­ria quan­to a go­i­a­ba­da de Larry Ro­ther: a ori­gem de to­dos os ma­les é jus­ta­men­te o ob­scu­ran­tis­mo. É a fal­ta de de­mo­cra­cia. De­mo­cra­cia de ver­da­de.

Fonte: Opção.

Comentários

Anônimo disse…
faltou apenas falar da imprensa corrompida... no mais o Brasil é simples como goiabada e queijo minas, o problema são os ratos do planalto.
Anônimo disse…
Uma mensagem a todos os membros de Ghiraldelli

Participei do Portal do jornalista Luis Nassif. Vocês viram. Coloquei uma questão assim: "o petismo continuará cegando"? Pronto! Fui banido. Eis aí a simples frase que causou o banimento. O próprio Nassif fez isso. Petista de carteirinha, ele simplesmente baniu o filósofo. Essa é a forma de governar do PT: a censura, a perseguição e o banimento. Peço os amigos que foram para lá pelo meu convite, que saiam e deixem uma marca de protesto. Obrigado pela solidariedade. Paulo

Visite Ghiraldelli em: http://ghiraldelli.ning.com
Anônimo disse…
Infelizmente ele não disse nada do que os mais atentos e não fanáticos já não saibam. O que angustia é não saber como resolver a questão quando existe um número significativo que "elementos" que pensam nas vantagens pessoais e momentâneas. A mídia escrita e falada depende de licença do governo e está, na maioria das vezes, endividada, vende-se, como possívelmente seja o caso da Globo. Defender confisco e miséria(fator previdenciário E NÃO REAJUSTE compatível, para aposentados e pensionistas, com o que contribuiu) é coisa de ignorante ou de quem tem "rabo preso". No caso, fico com os dois.
Interessante seria a população começar a boicotar a Globo como forma de agradecimento pelo "apoio"!!!!!!!!

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